CAPÍTULO 1
NASCIMENTO – PARENTESCO – PRIMEIROS AVANÇOS
RELIGIOSOS – SÉRIAS IMPRESSÕES E RELATO DE SUA EXPERIÊNCIA
Por Sereno E. Dwight
Poucos indivíduos já apareceram na igreja de Deus
que mereceram, e, de fato, receberam, mais altos tributos de respeito do que
Jonathan Edwards. Seus poderes intelectuais eram incomuns, e sua diligência no
cultivo desses poderes está fortemente marcada nessa vasta extensão da maior
parte do conhecimento que ele possuía. Se o considerarmos como se igualando a
Hartley, Locke e Bacon, na escala do intelecto, pouco temos a temer de que sua
habilitação a tal distinção seja contestada. Sua mente poderosa captava com
facilidade aqueles assuntos nos quais outros falhavam. Ele via a verdade quase
intuitivamente, e era igualmente afiado na detecção do erro em todos os seus
variados contornos. Este homem distinto reivindica admiração, não meramente com
base na força incomum dos poderes intelectuais, e pela intensa aplicação da
mente, recompensada com realizações proporcionais, mas também como um servo
muito humilde e devoto de Cristo. Trazia tudo o que havia recebido ao seu
serviço, e vivia apenas para Ele. Sua alma era, de fato, um templo do Espírito
Santo, e sua vida manifestava uniformemente toda a simplicidade, pureza,
desinteresse e o caráter elevado do evangelho de Cristo. A glória de Deus era
seu objeto supremo, seja quando ocupado em seus exercícios devocionais, seus
estudos, suas relações sociais, o ofício de seu ministério pastoral, ou nas
publicações de seus escritos. Todos os motivos inferiores parecem não ter tido
qualquer influência detectável sobre ele. Enquadrava-se plenamente na linguagem
expressiva de Paulo: “Pois o amor de
Cristo nos constrange,” “Para mim, o
viver é Cristo.” Seu exemplo pessoal instruirá, animará e encorajará por
muito tempo, e seus escritos necessariamente serão muito altamente estimados
enquanto prevalecer o amor pela verdade.
Foi com justiça observado que: “O número daqueles
homens que produziram grandes e permanentes mudanças no caráter e condição da
humanidade, e estamparam sua própria imagem nas mentes das gerações
subsequentes, é comparativamente pequeno. E, até mesmo desse pequeno número, o
grosso deve sua superior eficiência, ao menos em parte, a circunstâncias
externas, enquanto que a muitos poucos pode-se atribuí-lo à simples força do próprio intelecto. Contudo, aqui e ali, pode-se achar um indivíduo que,
pela sua mera energia mental, mudou o curso do pensamento e sentimento humano,
e conduziu a humanidade adiante nesse novo e melhor caminho que abriu para a
sua vista. Jonathan Edwards foi um desses indivíduos. Nascido em uma
colônia obscura, no meio de um ermo, e educado em um seminário que dava seus
primeiros passos, passou a melhor parte de sua vida como pastor de uma vila fronteiriça,
e o restante como missionário para os índios, em um acampamento ainda mais
humilde. Ele descobriu, e desvendou um sistema do governo moral divino tão
novo, tão claro, tão pleno, que, logo na sua primeira revelação, nem necessitou
de algum auxílio de seus amigos, nem temeu oposição alguma de seus inimigos, e,
por fim, constrangeu um mundo relutante a se curvar em cortesia à sua verdade.”
Jonathan Edwards nasceu no dia 5 de outubro de
1703, em Windsor, às margens do [Rio] Connecticut. Seu pai, o Rev. Timothy
Edwards, era pastor daquele lugar há cerca de 60 anos. Timothy Edwards morreu
em janeiro de 1758, aos 89 anos de idade, menos de dois meses antes de seu
único filho. Era um homem de grande piedade e prática. No dia 6 de novembro de
1694, casara-se com Esther Stoddard, filha do reverenciado e celebrado Solomon
Stoddard, de Northampton, quando esta tinha 23 anos. Viveram juntos como casados
por mais de 63 anos. A Sra. Edwards, mãe de nosso autor, nascera em 2 de julho
de 1672, e viveu até quase os noventa anos de idade, (alguns anos a mais que
seu filho); um exemplo notável de pouca perda dos poderes mentais em tão
avançada idade. Este venerável casal teve onze filhos: um homem, o objeto
destas memórias, e dez mulheres, quatro das quais eram mais velhas, e seis mais
novas que ele.
Devido ao caráter altamente espiritual e às
realizações intelectuais de seus pais, se poderia naturalmente esperar que sua
educação primária fosse acompanhada de vantagens incomuns. E assim aconteceu. Muitas
foram as preces apresentadas pela afeição paternal para que esse único e amado
filho pudesse ser cheio do Espírito Santo, que conhecesse desde a infância as
Santas Escrituras e fosse grande aos olhos do Senhor. Aqueles que, com esse
fervor e constância, o recomendavam a Deus, manifestavam igual diligência em
treiná-lo para Deus. A oração estimulava a ação, e a ação, por seu turno, era
novamente encorajada pela oração. O círculo doméstico era um cenário de súplica,
e também de instrução. Na residência de tais servos exemplares de Deus, a
instrução abundava. Aquilo que o olho via, bem como o que o ouvido ouvia,
formava uma lição. Nada havia no exemplo dos que ensinavam que diminuísse a
força da instrução. Nada havia nos hábitos sociais que fosse contrário às
lições de sabedoria, e infundissem aqueles princípios que, após anos, produziam
o fruto da tolice e do pecado. Ao contrário, havia tudo para alargar, purificar
e elevar o coração, e ao mesmo tempo treinar a mente para aqueles exercícios do
pensamento, dos quais somente se podem esperar eminentes realizações.
As fiéis instruções religiosas de seus pais “o
tornaram, quando criança, familiarmente íntimo com Deus e com Cristo, com seu
próprio caráter e dever, com o caminho da salvação, e com a natureza daquela
vida eterna que, começando na terra, é aperfeiçoada no céu.” Suas orações não
foram esquecidas, e seus esforços não permaneceram sem efeito. No progresso da
infância, ele foi, em diversos momentos, objeto de fortes impressões
religiosas. “Isso foi particularmente verdadeiro alguns anos antes de ir para a
faculdade, durante um poderoso reavivamento da religião na congregação de seu
pai. Ele, e dois outros rapazes de sua idade, que tinham os mesmos sentimentos que
ele, levantaram uma tenda em um lugar muito retirado, num pântano, para servir
como lugar de oração, e se retiravam para ali para a oração social. Isso
continuou por um longo período; mas as impressões, ao fim, desapareceram, e, em
sua própria opinião, não foram seguidas por quaisquer efeitos permanentes de
uma natureza salutar.”
O período exato quando considerou ter entrado
na vida religiosa, não menciona em lugar algum, nem foi achado qualquer
registro da época em que fez a pública profissão da religião. Até mesmo a
igreja a qual se afiliou certamente não teria sido conhecida, não fora o fato
de que, em uma ocasião, alude a si mesmo como membro da igreja em East Windsor. Baseado em várias circunstâncias, parece que o tempo em que se uniu a ela não
foi muito distante da época de sua partida para a faculdade. Das opiniões e
sentimentos de sua mente sobre esse assunto tão importante, tanto antes quanto
após esse evento, há um relato bastante satisfatório e instrutivo que foi
achado entre seus papéis, escritos por sua própria mão, cerca de vinte anos
depois, para seu uso privado. É como se segue:
“Tive uma variedade de preocupações e exercícios
acerca da minha alma desde a minha infância; mas tive duas temporadas mais
notáveis de despertamento, antes que encontrasse com aquela mudança pela qual
fui trazido a estas novas disposições, e a este novo senso das coisas, que
tenho tido desde então.
A primeira vez foi quando eu era um garoto, alguns
anos antes de ir para a faculdade, em uma época de notável despertamento na
congregação de meu pai. Fui, então, profundamente afetado por muitos meses, e
me preocupava com as coisas da religião, e com a salvação de minha alma e
abundava nos deveres religiosos. Costumava orar em secreto, cinco vezes ao dia,
e gastava muito tempo em conversas religiosas com outros garotos, e
costumávamos nos encontrar para orarmos juntos. Experimentava não sei que tipo
de deleite na religião. Minha mente muito se ocupava nisso, e tinha muito
prazer na justiça própria, e era meu deleite abundar nos deveres religiosos.
Eu, com alguns colegas de escola, nos ajuntamos e construímos uma tenda em um
pântano, em um lugar bastante retirado, para servir como lugar de oração. Além
disso, tinha lugares secretos particulares na floresta, para onde costumava me
retirar, e era, de tempos em tempos, muito afetado. Minhas afeiçoes pareciam
ser vívidas e facilmente movidas, e eu parecia estar em meu momento mais feliz
quando me ocupava nos deveres religiosos. Estou pronto a pensar que muitos
são enganados com essas afeições, e com esse tipo de deleite, como então eu tinha na
religião, e o confundem com a graça.
Mas, com o passar do tempo, minhas convicções e
afeições se deterioraram, e eu perdi inteiramente todas aquelas afeições e
deleites, e abandonei a oração secreta, ao menos quanto a qualquer preferência
constante por ela. Retornei como um cão ao seu vômito, e continuei nos caminhos
do pecado. Na realidade, às vezes me sentia muito incomodado, especialmente na
última parte do meu tempo na faculdade, quando agradou a Deus me atingir com a
pleurisia [infecção das pleuras pulmonares], com a qual me trouxe à beira do
túmulo, e me sacudiu sobre o abismo do inferno. E não demorou muito tempo após
minha recuperação, antes que caísse novamente nos meus antigos caminhos de
pecado. Mas Deus não permitiria que continuasse com aquela tranquilidade. Tinha grandes e violentas lutas interiores, até que, após muitos conflitos com
as inclinações ímpias, repetidas resoluções e compromissos, com os quais me
obrigava, por votos, a Deus, fui levado a romper completamente com todos os
caminhos ímpios e com todas as formas de pecado exterior conhecidas, e a me
aplicar na busca da salvação, e a praticar muitos deveres religiosos, mas sem
aquele tipo de afeição e deleite que anteriormente tinha experimentado.
Minha preocupação agora gerava mais lutas e
conflitos internos, e autorreflexão. Fiz da busca da salvação a principal
ocupação da minha vida. Contudo, parece a mim que a buscava de um modo
miserável, o que me fez algumas vezes desde então questionar se alguma vez
produziu algo que fosse salvífico, estando pronto a duvidar se tal busca
miserável alguma vez teve sucesso. Fui, realmente, levado à busca da salvação,
de uma maneira inédita. Senti uma inclinação para romper com todas as coisas do
mundo, para obter um interesse em Cristo. Minha preocupação continuava e
prevalecia, com muitos pensamentos esforçados e lutas interiores. Contudo,
nunca parecia ser apropriado expressar essa preocupação pelo nome de terror.
Desde a minha infância, minha mente esteve repleta
de objeções contrárias à doutrina da soberania de Deus, em escolher os que
quisesse para a vida eterna e rejeitar os que lhe agradasse, deixando-os
perecer eternamente, e serem para todo o sempre atormentados no inferno.
Costumava parecer uma doutrina horrível para mim. Mas, me lembro muito bem o
tempo quando pareci estar convencido, e plenamente satisfeito quanto à
soberania de Deus, e sua justiça em dispor desta maneira eternamente dos
homens, de acordo com sua boa vontade soberana. Mas nunca consegui dar um
relato de como, ou por quais meios, fui assim convencido, nem ao menos
imaginar, à época, nem muito tempo depois, que houve uma extraordinária
influencia do Espírito de Deus nisso. Somente que agora via mais longe, e minha
razão apreendeu a justiça e razoabilidade disso. Contudo, minha descansou, e
pôs um fim em todos aqueles sofismas e objeções.
E houve uma maravilhosa alteração em minha mente,
com respeito à doutrina da soberania de Deus, daquele dia até hoje, de modo que
eu raramente achei, desde então, sequer uma pequena objeção contraria, no
sentido mais absoluto, ao fato de Deus mostrar misericórdia a quem ele tem
misericórdia, e endurecer quem lhe apraz. A soberania e justiça absoluta de
Deus, com respeito à salvação e condenação, é no que minha mente parece
descansar segura, tanto quanto em qualquer coisa que vejo com meus olhos; ao
menos é assim, às vezes. Mas tive, com frequência, desde essa primeira
convicção, outro tipo de senso da soberania de Deus, diferente do que tive
antes. Com frequência, desde então, tive não apenas uma convicção, mas uma deliciosa convicção. A doutrina me
parece sempre extremamente agradável, brilhante e doce. A soberania absoluta é
o que amo atribuir a Deus. Mas minha primeira convicção não era essa.
A primeira ocasião que me lembro desse tipo de
deleite doce e interior em Deus e nas coisas divinas, no qual tenho vivido
bastante desde então, foi ao ler estas palavras: “1 Timóteo 1:17 Assim,
ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos
séculos. Amém!”
Enquanto as lia, veio à minha alma, e era como se,
por assim dizer, fosse disseminado através dela, um senso da glória do Ser
Divino; um novo senso, bem diferente de qualquer outro que experimentara antes.
Nunca quaisquer palavras da Escritura pareceram para mim como aquelas. Pensei
comigo mesmo que Ser excelente era aquele, e como eu seria feliz se pudesse desfrutar
desse Deus, e ser arrebatado por ele para o céu; e ser, por assim dizer, tragado
para sempre! Continuava falando, e, por assim dizer, cantando, estas palavras
da Escritura a mim mesmo. E fui orar a Deus para que pudesse desfrutá-lo; e
orei de um modo bastante diferente do que costumava fazer, com uma nova espécie
de afeição. Mas nunca me veio ao pensamento que houvesse algo de especial, ou
de natureza salvífica nisto.
Mais ou menos a partir desse tempo comecei a ter
um novo tipo de apreensão e ideias de Cristo, e da obra da redenção, e do
glorioso caminho da salvação por ele. Um doce senso interior das coisas, às
vezes, vinha ao meu coração; e minha alma foi conduzida a agradáveis visões e
contemplações dessas coisas. E minha mente estava grandemente ocupada em gastar
meu tempo na leitura e meditação sobre Cristo, sobre a beleza e excelência de
sua pessoa, e o amável caminho da salvação pela livre graça nele. Não achei
nenhum livro tão deleitoso para mim, quanto os que tratavam desses assuntos.
Aquelas palavras de Cânticos 2:1, costumavam estar abundantemente comigo: Eu sou a rosa de Sarom, o lírio dos vales.
As palavras pareciam para mim docemente representar a amabilidade e beleza de
Jesus Cristo. Todo o livro de Cânticos costumava ser agradável para mim, e eu
sempre estava ocupado na leitura dele, naquela época. E achava, de tempos em
tempos, uma doçura interior, que me conduzia em minhas contemplações. Isto não
sei expressar de outro modo, senão por uma calma, doce abstração da alma de
todas as preocupações deste mundo; e, às vezes, um tipo de visão, ou ideias e
imaginações fixas de estar sozinho nas montanhas, ou em algum ermo solitário,
longe de toda humanidade, docemente conversando com Cristo, e envolvido e
absorvido em Deus. O senso que tive das coisas divinas, com frequência, inflamava
repentinamente, por assim dizer, uma doce chama em meu coração, um ardor de
alma, que não sei como expressar.
Não muito tempo depois que comecei a experimentar
essas coisas, fiz um relato a meu pai de algumas delas, que tinham se passado
em minha mente. Fui bastante afetado pela conversa que tivemos, e quando ela
terminou, fui para longe, sozinho, a um lugar solitário no pasto de meu pai,
para contemplação. E, enquanto andava por lá, e olhava para o céu e as nuvens,
veio à minha mente um senso tão doce da gloriosa majestade e graça de
Deus, que não sei como expressar. Parecia ver a ambas em uma união doce;
majestade e mansidão juntas: era uma majestade doce, gentil e santa. E também
uma mansidão majestosa, uma doçura terrível, uma gentileza alta, grandiosa e
santa.
Depois disso, meu senso das coisas divinas
gradualmente aumentou, e se tornou mais e mais vívido, e tive mais dessa doçura
interior. A aparência de todas as coisas foi alterada; parecia haver, por assim
dizer, uma calma, doce amostra ou exibição da glória divina, em quase todas as
coisas. A excelência de Deus, sua sabedoria, sua pureza e amor pareciam se
mostrar em todas as coisas: no sol, lua e estrelas; nas nuvens e no céu azul;
na grama, flores, árvores; na água e toda a natureza, que costumavam prender
grandemente minha mente.
Com frequência, costumava sentar e olhar a lua por
um longo tempo; e, durante o dia, gastava muito tempo vendo as nuvens e o céu,
para contemplar a doce glória de Deus nestas coisas. Enquanto isso, cantava,
com uma voz baixa, minhas contemplações do Criador e Redentor. E havia poucas
coisas, entre todas as obras da natureza, que fossem tão doces quanto o trovão
e o relâmpago, que anteriormente haviam sido tão terríveis para mim. Antes,
geralmente era aterrorizado de modo incomum com o trovão, e costumava ser
tomado pelo terror quando via uma tempestade com trovões surgindo. Mas agora,
ao contrário, isso me regozijava. Eu sentia Deus, se posso assim dizer, no
primeiro surgimento de uma tempestade; e costumava aproveitar a oportunidade,
em tais tempos, para me preparar a fim de ver as nuvens, e os relâmpagos brincarem,
e ouvir a voz majestosa e terrível dos trovões de Deus, que, muitas vezes, era
extremamente agradável, me levando à doces contemplações de meu grande e
glorioso Deus. Enquanto estava assim ocupado, sempre me parecia natural cantar
ou recitar minhas meditações; ou falar meu pensamento por meio de solilóquios
em uma voz cantante.
Sentia, então, grande satisfação quanto ao meu bom
estado; mas aquilo não me contentava. Tinha veementes desejos de alma por Deus
e por Cristo, e por mais santidade, com a qual meu coração desejava estar
cheio, e pronto a explodir. Isto sempre trazia à minha mente as palavras do
salmista: Sl 119:20: “Consumida está a minha alma por desejar.”
Sempre sentia uma tristeza e lamentava no coração que não tivesse me tornado para
Deus mais cedo, para que tivesse tido mais tempo de crescer em graça. Minha
mente estava enormemente fixada nas coisas divinas; quase que perpetuamente na
contemplação delas. Passava a maior parte do meu tempo pensando nelas, ano após
ano. Frequentemente, andava sozinho pelas florestas, em lugares solitários,
para meditação, solilóquios, oração e conversa com Deus; e era sempre meu
costume, em tais tempos, cantar minhas contemplações. Estava constantemente em
oração exclamatória, onde quer que estivesse. A oração parecia natural para
mim, como o suspiro por onde as chamas internas do meu coração saíam.
As delícias que agora sentia nas coisas da
religião eram de um tipo bastante diferente daquelas anteriormente mencionadas,
que tive quando garoto, e o que tive então era tão sem noção quanto um cego de
nascença tem das cores agradáveis e belas. Elas eram de uma natureza mais
interior, pura, animadora da alma e refrescante. Aqueles deleites anteriores
nunca alcançaram o coração; e nem surgiram de qualquer visão da excelência divina
das coisas de Deus, ou de qualquer sabor de satisfação da alma pelo bem que
concede a vida que havia nelas.
Meu senso das coisas divinas pareceram aumentar
gradualmente, até que fui pregar em Nova York, o que se deu cerca de um ano e meio
depois que este senso começou. Enquanto estava lá, senti este senso de modo
muito claro, em grau muito maior do que tinha sentido antes. Meus desejos por
Deus e pela santidade cresceram bastante. Puro e humilde, santo e celestial, o
cristianismo parecia extremamente amável para mim. Sentia um desejo ardente de
ser, em tudo, um cristão completo; e de ser conformado à bendita imagem de
Cristo; e que pudesse viver, em todas as coisas, de acordo com as normas puras,
doces e benditas do evangelho. Tinha uma sede ávida por progresso nestas
coisas. Isto me levava a perseguir e a me esforçar por elas. Era minha luta
contínua, noite e dia, e minha investigação constante, saber como eu poderia ser mais santo, e viver mais santamente. E como poderia me tornar ainda mais filho de
Deus, e discípulo de Cristo. Eu agora buscava um aumento da graça e da
santidade, e uma vida santa, com muito mais avidez do que havia buscado a graça
antes de alcançá-la. Costumava estar continuamente a me examinar, e a estudar e
planejar os caminhos e meios prováveis para que vivesse uma vida santa, com
maior diligência e veemência do que qualquer coisa que já buscara em minha
vida. Contudo, ainda tinha muita dependência de minha própria força, o que,
posteriormente, provou ser de grande dano para mim. Minha experiência ainda não
me mostrara, como tem feito desde então, minha extrema fraqueza e impotência,
de todos os modos; e as profundezas sem fim da corrupção secreta e do engano
que havia em meu coração. Contudo, persisti com minha ávida procura por mais
santidade e conformidade com Cristo.
O céu que eu desejava era um céu de santidade;
estar com Deus e gastar minha eternidade no amor divino, e na santa comunhão
com Cristo. Minha mente estava bastante absorta com as contemplações do céu, e
com as delícias de lá, com o viver em perfeita santidade, humildade e amor. E,
na época, costumava parecer uma grande parte da felicidade do céu que lá os
santos pudessem expressar seu amor por Cristo. A mim me parecia grande
obstáculo e peso que o que eu sentia por dentro não pudesse expressar como
desejava. O ardor interior de minha alma parecia estar travado e trancado, e
não podia livremente se inflamar como deveria. Pensava sempre em como, no céu,
esta fonte poderia livre e plenamente fluir e se expressar. O céu parecia
extremamente deleitoso, como um mundo de amor; e onde toda a felicidade
consistia em viver no puro, humilde, celestial e divino amor.
Lembro-me dos pensamentos que tinha então acerca
da santidade. Às vezes, dizia a mim mesmo: ‘Certamente sei que amo a santidade,
tal como o evangelho prescreve.’ Parecia-me que nela nada havia senão aquilo
que era arrebatadoramente amável; a mais alta beleza e amabilidade – uma beleza
divina; muito mais pura que qualquer
coisa aqui da terra; e que tudo o mais era como lama e corrupção em comparação
com ela.
A santidade, como então escrevi em algumas de
minhas contemplações a seu respeito, parecia ser de uma natureza doce,
agradável, charmosa, serena e calma. Ela trazia uma pureza, brilho, paz e
arrebatamento inexprimível para a alma. Em outras palavras, era o que tornava a
alma semelhante ao jardim de Deus, com todo tipo de flores agradáveis,
desfrutando de uma doce calma, e dos raios suaves e vívidos do sol. A alma do
verdadeiro cristão, como então escrevi nas minhas meditações, se mostrava como
uma florzinha branca que vemos na primavera do ano: pequena e humilde sobre o
solo, desabrochando para receber os agradáveis raios da glória do sol; regozijando-se,
por assim dizer, em um calmo arrebatamento; exalando em volta uma doce
fragrância; permanecendo pacífica e amorosamente em meio às outras flores,
todas semelhantemente abrindo seus botões para beber da luz do sol. Não havia
nenhuma parte da criatura que me fizesse ter um senso tão grande de sua
amabilidade como a humildade, o quebrantamento do coração e a pobreza de
espírito; e não havia nada pelo que ansiasse mais avidamente. Meu coração
desejava ardentemente me rebaixar diante de Deus, no pó, para que pudesse ser
nada e Deus ser tudo, para que eu
fosse como uma criancinha.
Enquanto estava em Nova York, às vezes, era muito
afetado com as reflexões sobre minha vida passada, considerando como demorei
para que pudesse ser verdadeiramente religioso, e como tinha sido ímpio até
então. E, uma vez que pensava, chorava abundantemente, e por um tempo
considerável.
No dia 12 de janeiro de 1723, fiz uma solene
dedicação de mim mesmo a Deus e a escrevi. Entregava-me, e a tudo que tinha,
para Deus, para não pertencer no futuro, em nenhum aspecto, a mim mesmo; para
agir como alguém que não tem direito a si mesmo, em nenhum aspecto. E fiz um
voto solene de tomar a Deus como minha inteira porção e felicidade, a não
buscar a nada mais como qualquer parte de minha felicidade, nem agir como se
fosse; e a tomar sua lei como regra constante de minha obediência. Dispus-me a
lutar com todas as minhas forças contra o mundo, a carne e o diabo, até o fim
de minha vida. Mas tenho razão para me humilhar infinitamente quando considero
o quanto falhei em responder a minhas obrigações.
Tive, à época, muitas conversas religiosas e doces
com a família com quem vivia, com o Sr. John Smith e sua piedosa mãe. Meu coração
estava ligado em afeição àqueles em que havia sinais da verdadeira piedade. Não
podia suportar nem mesmo pensar em outras companhias que não fossem a dos
santos e discípulos do bendito Jesus. Tinha grandes desejos pelo avanço do
reino de Cristo no mundo, e minhas orações secretas costumavam, em grande
parte, ser ocupadas com isso. Se ouvisse a menor sugestão de qualquer coisa que
acontecera em alguma parte do mundo, que me parecia, por algum aspecto ou
outro, ser favorável aos interesses do reino de Cristo, minha alma prontamente
se agradava, e isto muito me animava e refrescava. Costumava estar pronto a ler
os jornais públicos, principalmente com este propósito, para ver se conseguia
achar alguma notícia favorável aos interesses da religião [cristã] no mundo.
Retirava-me com frequência para um lugar
solitário, às margens do rio Hudson, a alguma distância da cidade, para a contemplação
das coisas divinas e conversação secreta com Deus; e tinha muitas horas doces
por lá. Às vezes, o Sr. Smith e eu andávamos por lá juntos, para conversar
sobre as coisas de Deus; e nossa conversa costumava girar em torno do avanço do
reino de Cristo no mundo, e das gloriosas coisas que Deus realizaria por sua
igreja nos últimos dias.
Tinha então, e em outros tempos, o maior deleite
nas Sagradas Escrituras, acima de qualquer livro. Muitas vezes, ao lê-la, cada
palavra parecia tocar meu coração. Sentia uma harmonia entre algo no meu
coração e aquelas doces e poderosas palavras. Parecia sempre ver muita luz
exibida em cada frase, e um alimento tão refrescante comunicado que não
conseguia ir adiante na leitura. Com frequência, me detinha muito tempo em uma
frase, para ver as maravilhas contidas ali; porém, quase todas as frases
pareciam estar cheias de maravilhas.
Voltei de Nova York em abril de 1723, e tive uma despedida bastante dolorosa da Sra. Smith
e seu filho. Meu coração parecia afundar dentro de mim, enquanto deixava a
cidade e a família onde tinha desfrutado tantos dias doces e agradáveis. Vim de
Nova York a Wethersfield de barco e, enquanto navegava, mantive a vista na
cidade enquanto pude. Contudo, naquela noite, após esta dolorosa partida, fui
grandemente confortado em Deus em West Chester, onde desembarcamos para nos
alojarmos. Também tive um tempo agradável durante toda a viagem para Saybrook.
Era doce para mim pensar em encontrar queridos cristãos no céu, onde não mais
haveria despedida. Em Saybrook, desembarquei para me alojar no sábado, e lá
guardei o Dia do Senhor, no qual tive um doce e refrescante tempo enquanto
andava sozinho nos campos.
Depois que cheguei à minha casa, em Windsor,
permaneci bastante tempo em disposição de mente semelhante a que tive em Nova
York; apenas algumas vezes sentia meu coração pronto a afundar de saudades
pelos meus amigos de lá. Meu auxílio estava nas contemplações do estado
celestial, como descubro no meu diário de 1º de maio de 1723. Era um consolo
pensar nesse estado, onde há plenitude de alegria; onde reina celestial, calmo
e deleitoso amor, sem misturas; onde há continuamente as mais queridas expressões
deste amor; onde há o desfrute das pessoas amadas, sem que jamais haja
despedidas; onde aquelas pessoas que neste mundo parecem tão amáveis serão
verdadeira e inexprimivelmente mais amáveis, e cheias de amor por nós. E quão
secretamente os amantes mútuos se unirão para cantar os louvores de Deus e do
Cordeiro! Como nos encherá de alegria pensar que este gozo, este doces
exercícios, jamais cessarão, mas durarão por toda a eternidade!”
Assim profundas, decididas e poderosas eram as
operações da divina graça sobre a mente deste eminente servo de Cristo. Que o
seu entendimento era muito iluminado nas coisas de Deus, e seu coração
profundamente afetado por elas, são circunstâncias que de imediato chamarão a
atenção de todo observador sério. Havia nele uma santa ansiedade para obter o
mais satisfatório testemunho de uma mudança de coração. Com este propósito, ele
examinava íntima e diligentemente a si mesmo; não tinha inclinação alguma para
evitar este autoexame. O exame pessoal parece ter sido considerado por ele ao
mesmo tempo como algo agradável e um exercício importante. Muitos crentes
professos se revoltam com o pensamento de tal pesquisa interior. Eles se
contentam em olhar (e isso apressadamente) as coisas exteriores, mas não olham
para dentro, ainda que esta
negligência ponha em perigo seu bem eterno. Os sentimentos com os quais os
homens encaram o dever do exame pessoal podem, com justiça, ser vistos como um
critério preciso de seu estado espiritual, pois, em proporção à preocupação
deles com a eternidade, estarão suas disposições em testar a si mesmos. Em
outras palavras, na mesma medida em que a graça existe, haverá um desejo de
investigar plenamente sua existência e progresso.
Após uma revisão da declaração dada pelo Sr.
Edwards quanto às suas primeiras experiências religiosas, é evidente que ele
não era dos que se satisfazem com quaisquer bases insuficientes: nenhuma
indicação de descuido ou presunção pode ser discernida. Ele se olhava com um
santo zelo; pensava, lia, conversava e, acima de tudo, orava, para que pudesse
ser capacitado a mais acuradamente sondar o próprio coração, e assim escapar do
perigo do autoengano, e ser convencido por provas que passaria pelo teste do
julgamento de Deus; que era um filho da luz, objeto de santidade e herdeiro da
glória. E assim, estudando a si mesmo sob a penetrante luz da Palavra, e das
graciosas influências do Espírito de Deus, adquiriu este exato conhecimento dos
variados exercícios e amostras exteriores do caráter cristão, o que o
capacitou, em anos posteriores a, com tanta habilidade, separar aparências
ilusórias daquilo que é sólido, e marcar a forte diferença entre o mero
professo do nome de Cristo, e do verdadeiro participante do poder do evangelho.
Foi nestes anos iniciais de sua vida que estas perspectivas corretas foram
formadas, estas mesmas que, mais tarde, se expandiram em seu tratado admirável
sobre as Afeições Religiosas.
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