terça-feira, 27 de maio de 2014

MEMÓRIAS DE JONATHAN EDWARDS - CAP. 3

PRODUÇÕES RELIGIOSAS INICIAIS – “MISCELÂNEAS” – NOTAS SOBRE AS ESCRITURAS – INÍCIO DE SUA PREGAÇÃO – RESOLUÇÕES
Por Sereno E. Dwight
Uma preocupação consciente com o dever apareceu grandemente tanto nos primeiros quanto nos últimos dias de Jonathan Edwards. Na infância, o espírito de amor e obediência o guiava totalmente; e como aprendiz, descobriu cada disposição honrável para si, encorajando as pessoas que ansiosamente auxiliavam no seu progresso, e naquilo que era justamente considerado como a mais calorosa de suas incomuns realizações. A criança, o jovem, o homem, todos apresentaram à vista a mesma mente superior, em diferentes graus de avanço, mas ainda assim, semelhantes indicativas das mesmas excelências gerais.
Enquanto estava na faculdade, prestou a mais assídua e bem sucedida atenção a todos os seus deveres designados, e, em particular, ao estudo da filosofia mental e física. Contudo, ainda encontrou tempo para buscar um caráter mais elevado e espiritual. Sua inteira educação, desde a mais tenra infância, e os conselhos dos pais, bem como seus próprio sentimentos, o motivaram a essas buscas.
“Ler a Bíblia diariamente, e lê-la em conexão com outros livros religiosos, diligente e atentamente, no Dia do Senhor, era, nos primeiros dias da Nova Inglaterra, o dever habitual de toda criança. E a família de seu pai, ainda que atenta ao devido cultivo da mente e dos costumes, não havia perdido nem um pouco da severidade e do cuidado que caracterizavam os peregrinos. Os livros que ele achou na casa de seu pai, a conversa dos ministros que sempre recorriam a sua casa, os costumes do tempo, bem como a mais imediata influência da instrução e exemplo paternal, naturalmente incitavam uma mente como a sua para a precoce contemplação e investigação de muitas das verdades e princípios da teologia. Também tinha testemunhado na congregação de seu pai, antes de sua admissão na faculdade, diversos reavivamentos extensos da religião. E em dois deles as impressões sobre sua mente haviam sido extraordinariamente profundas e solenes. O nome familiarmente dado pelo povo comum da Nova Inglaterra a estes eventos – “uma atenção religiosa,” e “uma atenção geral para a religião” – indica a natureza deles. Uma pessoa pessoalmente familiarizada com estes eventos não precisa ser informada de que, durante seu progresso, as grandes verdades da religião, como ensinadas nas Escrituras, e como explicadas nos escritos dos teólogos, tornam-se os objetos do interesse geral e intenso, e de estudo prático minucioso. Ou ainda que o conhecimento adquirido por todo um povo em tais tempos, em um período comparativamente curto, com frequência excede as aquisições de muitos anos anteriores. Com todas estas coisas em vista não surpreende que a estes dois tipos de leitura ele tenha se devotado muito cedo, com grande diligência e sucesso.”
Duas de suas primeiras Resoluções se relacionam a esse assunto, nas quais se propõe “a estudar as Escrituras tão contínua, constante e frequentemente a ponto de poder encontrar e claramente perceber a mim mesmo crescendo no conhecimento dela.” Nunca perdeu de vista esta resolução. Em 8 de junho de 1723, também propôs que, a qualquer momento que se achasse em uma disposição débil e relaxada, leria novamente sua própria obra “Anotações e Reflexões de Natureza Religiosa,” a fim de animá-lo ao seu dever. Estas “Anotações e Reflexões” eram muito numerosas. O primeiro manuscrito de suas “Miscelâneas” está em formato de fólio [livro numerado por folhas (frente e verso) e não por páginas], e consiste de quarenta e quatro folhas de papel almaço, escritas separadamente, e costuradas. Quando iniciou a obra, obviamente não suspeitava do tamanho que ela tomaria, nem tinha ele formado o plano final de arranjo. Intitulou o primeiro artigo como “Da Santidade”, e tendo finalizado-o, e rabiscado um linha de separação através da página, começou o segundo: “Da mediação e satisfação de Cristo.” O mesmo ocorre com o terceiro e quarto. O quinto ele escreve, sem uma linha de separação, em grandes letras: “Felicidade Espiritual.” Após este, o assunto de cada novo artigo está impresso, ou escrito, em letras grandes. Seu primeiro artigo foi escrito na segunda página de uma folha de papel solta; e tendo escrito na segunda, terceira e quarta páginas, voltou para a primeira. Começou a numerar seus artigos pelas letras do alfabeto, a, b, c, e tendo finalizado, iniciou com uma letra dupla, aa, bb, cc. Quando a sequência estava findada, descobrindo que sua obra estava alargada, tomou os números regulares 1, 2, 3, etc., e a este plano, tanto em relação aos assuntos quanto aos números, posteriormente deu prosseguimento.
O início da obra está escrito em uma caligrafia notavelmente pequena e arredondada, quase a mesma com a qual são escritas suas primeiras produções. Isto se estende até por volta de 150 artigos, e, após isso, mudou perceptivelmente para uma caligrafia de algum modo mais formada e fluente. Estes parecem obviamente ter sido escritos durante os últimos anos de sua vida na faculdade, e dos anos de sua residência na faculdade, no Bacharelado de Artes. Largas porções desta obra serão encontradas na presente edição de suas Obras, e um número daquelas dos primeiros artigos. Tais são as Observações Miscelâneas e as Anotações Miscelâneas, vol. ii, pág. 459 e as Miscelâneas, pág 525. Nestas serão encontrados muitos de seus mais originais e profundos pensamentos e discussões sobre assuntos teológicos.
Seu estudo regular e diligente da sagrada Escritura cedo o levou a descobrir que ele abria diante de si um campo quase ilimitado de investigação e pesquisa. Algumas passagens ele descobriu terem sido traduzidas incorretamente. Muitas eram bastante obscuras, e difíceis de explicar. Em muitas havia aparentes inconsistências e contradições. Muitas haviam sido há muito empregadas como provas de doutrinas e princípios, aos quais não faziam nenhuma referência possível. As palavras e frases, bem como os sentimentos e narrativas, em um aspecto, ele via ilustrados e interpretados por outro. Percebeu que o Antigo Testamento, em sua linguagem, história, doutrinas e culto, em sua alusão a costumes e maneiras, em suas profecias, tipos e imagens, era introdutório e explicativo para o Novo [Testamento]; enquanto que o Novo, ao apresentar a plena completude de todo o plano e desígnio de seu Autor comum, desvendava a verdadeira intenção e relação de cada parte do Antigo. Encarando o volume sagrado com a mais alta veneração, pareceu ter resolvido, enquanto era membro da faculdade, que iria, até onde fosse possível, ficar possuído, em cada parte que lia, do verdadeiro sentido de seu Autor. Com esta perspectiva, começou sua “Notas sobre as Escrituras”, obviamente tornando sua regra padrão estudar cada passagem que ele lia que apresentava a menor dificuldade para a sua mente, ou que soubesse ter sido reputada difícil por outros, até que tal dificuldade fosse satisfatoriamente removida.
O resultado de suas investigações ele regularmente, e à época, confiava à escrita; a princípio em meias folhas separadas, em formato A5. Tendo, porém, descoberto a inconveniência deste método em seus outros escritos juvenis, logo formou pequenos panfletos de folhas, que posteriormente foram transformadas em volumes. Alguns dos artigos, cerca de cinquenta, parecem ter sido escritos enquanto ainda estava na faculdade. O restante, enquanto se preparava para o ministério e durante sua vida subsequente. Que ele não tinha suspeitas do tamanho que a obra tomaria é evidente, e se posteriormente planejou a sua publicação, como uma ilustração das mais difíceis e obscuras passagens da Bíblia, talvez não possa ser determinado com certeza. Alguns dos artigos de natureza histórica ou mitológica são marcados com aspas dos escritos de outros, e estão omitidos na presente edição de suas Obras. O leitor, após investigar a obra, ficará satisfeito que sejam frutos de sua própria investigação, e que seu modo de remover as dificuldades era – não como é com frequência, com disfarce ou má representação delas, mas lhes dando sua plena força, e encarando-as com argumentos limpos. Talvez nenhuma coleção de notas sobre as Escrituras tão originais possa ser encontrada. A partir do número prefixado a cada artigo, se descobrirá ser fácil selecionar aquelas que foram resultado de seus labores iniciais. Tal plano de investigar e explicar as dificuldades do livro sagrado, em período tão precoce da vida, provavelmente não encontra exemplo igual, e demonstra uma maturidade de realizações morais e intelectuais raramente igualada. Entre as mais interessantes e capazes destas investigações se descobrirá a discussão sobre o sacrifício da filha de Jefté (Jz 11:29-40) e sobre o princípio apresentado por Paulo em Romanos 8:28: Todas as coisas cooperam para o bem daqueles que amam a Deus. Esta, por estar contida em sua carta ao Sr. Gillespie, de 4/9/1747, está omitida nas notas sobre as Escrituras.”
A classe da qual foi um membro terminou seu curso superior regular em setembro de 1720, antes que tivesse dezessete anos de idade. Nesse período, e por um longo tempo posterior, o único exercício - à exceção das Teses Latinas, dadas no início da classe de bacharelado - era o Salutatory [uma declamação de boas vindas], o qual também era um Valedictory [uma declamação de despedida, geralmente ao final da graduação], uma Oração em Latim. Ele foi premiado neste exercício, por ter obtido o mais alto conceito como erudito entre os membros de sua classe.
Ele residiu na faculdade por quase dois anos depois de sua primeira formação, preparando-se para o ofício do ministério. Após isso, tendo passado pelos testes de costume, recebeu a licença para pregar. Isto ocorreu aos dezenove anos de idade. Devido a uma solicitação de diversos ministros na Nova Inglaterra, a quem foi confiado que agissem em prol dos presbiterianos em Nova York, ele foi para aquela cidade no início de agosto de 1722, e lá pregou, com grande aceitação, por cerca de oito meses. Enquanto esteve lá, residiu alegremente na casa da Sra. Smith, que, juntamente com seu filho, o Sr. John Smith, ele considerava como pessoas de piedade incomum e pureza de vida. Com eles formou uma íntima amizade cristã. Lá também encontrou um número considerável de pessoas, membros daquela igreja, que exibiam o mesmo caráter. Com estes aproveitou, em alto grau, todas os deleites e vantagens do relacionamento cristão. Sua ligação pessoal a eles tornou-se forte, e o interesse deles nele como homem e pregador foi tal que calorosamente solicitaram que com eles permanecessem pelo resto da vida. Declinar deste cândido convite foi muito aflitivo para seus sentimentos; entretanto, devido à pequenez dessa congregação, e de algumas dificuldades peculiares que a acompanhavam, não pensou que houvesse uma perspectiva racional de utilidade e conforto lá. Após uma despedida muito dolorosa dos seus bons amigos, sob cujo hospitaleiro teto tinha residido por tanto tempo e com tanta felicidade, deixou a cidade em 26 de abril, de barco, e alcançou a residência de seu pai na quarta-feira, dia primeiro de maio. Lá passou o verão em rigoroso estudo, durante o qual foi de novo solicitamente requisitado pela congregação em Nova York, para que retornasse àquela cidade, e se estabelecesse entre eles. Contudo, suas perspectivas anteriores não se alteraram, portanto, ainda que fortemente inclinado por seus sentimentos para satisfazê-los, não pôde aceder a seus desejos. É provável que em nenhuma outra época de sua vida teve mais altas vantagens para a contemplação e deleite espiritual do que no período antes mencionado. Ele foi a Nova York em uma disposição deleitosa de mente. Lá encontrou um pequeno rebanho de Cristo, constrangido com o senso de sua própria fraqueza a “habitar juntamente em unidade,” e a sentir um senso prático de dependência de Deus. Estava no meio de uma família, cuja influência diária servia apenas para refrescar e santificar. Também tinha muito tempo livre para leitura religiosa, meditação, e oração. Nestas circunstâncias, a presente do Consolador parece ter sido uma realidade diária; do que encontrou evidência naquela pureza de coração que capacita os que a possuem a ver Deus, na paz que vai além de todo entendimento, e na alegria da qual não participa o estranho [Pv 14:10].
 Durante sua preparação para o ministério, sua residência em Nova York, e a residência subsequente na casa de seu pai, ele formou uma série de resoluções, perfazendo o número de setenta, que destinavam-se obviamente a si próprio somente, para regular seu próprio coração e vida, mas também eram apropriadas, devido à simplicidade cristã e ao caráter espiritual, a serem extremamente úteis para outros. Destas, as primeiras trinta e quatro foram escritas antes de 18 de dezembro de 1722, o tempo no qual seu Diário, como agora existe, começa. O tempo em particular e a ocasião da composição das demais, serão encontrados nesta mui interessante narrativa, na qual também estão muitas outras regras e resoluções, direcionadas à regulação de suas próprias afeições, de talvez igual excelência. Deve ser lembrado que foram todas escritas antes dos seus vinte e dois anos de idade. Uma vez que era inteiramente avesso à toda profissão [pública] e ostentação; e uma  vez que estas resoluções eram claramente dedicadas para serem vistas por ninguém, senão por ele mesmo – à exceção do olho que é onisciente – elas podem ser consideradas com justiça como a base de sua conduta e caráter, o plano pelo qual governava tanto as ações públicas quanto as secretas de sua vida. Como tais, interessarão profundamente ao leitor, não apenas por desvelarem a mais íntima mente de seu autor, mas à medida em que mostram, de maneira muito notável e convincente para a consciência qual é a verdadeira base da excelência grandiosa e distinta.
Ele estava muito bem familiarizado com a fraqueza e fragilidade humana, mesmo onde as intenções são muito sinceras, para adentrar em quaisquer resoluções precipitadamente, ou devido à confiança em sua própria força. Portanto, na abertura, olhou para Deus por ajuda, quem somente pode conceder sucesso no uso dos melhores meios, e na pretendida realização dos melhores propósitos. Isto ele põe no cabeçalho de todas as outras importantes regras: que sua inteira dependência estava na graça de Deus, enquanto ainda se propõe a recorrer à frequente e séria investigação delas, a fim de que pudessem se tornar o guia habitual de sua vida.

RESOLUÇÕES


“Estando sensível de que sou incapaz de fazer qualquer coisa sem a ajuda de Deus, eu, humildemente rogo que, pela Sua graça, me capacite a manter estas Resoluções, até onde forem conforme sua vontade, por amor de Cristo.
Lembre-se de ler estas Resoluções uma vez por semana.
1. Resolvi, Que farei o que quer que ache seja para a maior glória de Deus, e meu próprio bem, ganho, e prazer, durante toda minha existência, sem qualquer consideração acerca do tempo, quer agora, ou daqui a muitas miríades de eras. Resolvi, fazer o que quer que ache ser meu dever, e para o bem e vantagem da humanidade em geral. Resolvi assim o fazer, sejam quais forem as dificuldades que encontre, quantas e por maiores que sejam.
2. Resolvi, Continuamente me esforçar para descobrir alguma nova maneira e invenção para promover as coisas pré-mencionadas.
3. Resolvi, Se alguma vez cair e permanecer na apatia, a ponto de negligenciar qualquer porção destas Resoluções, arrepender-me de tudo que possa me lembrar, quando cair em mim.
4. Resolvi, Nunca fazer qualquer tipo de coisa, seja na alma ou no corpo, menos ou mais, a não ser o que tenda para a glória de Deus, nem vivenciá-la, ou permiti-la, se puder evitá-la.
5. Resolvi, nunca perder um instante do tempo, mas aproveitá-lo do mais frutífero modo que puder.
6. Resolvi, viver utilizando todas as minhas forças, enquanto viver.
7. Resolvi, Nunca fazer qualquer coisa que temeria fazer se fosse a última hora de minha vida.
8. Resolvi, Agir, em todos os aspectos, tanto na fala quanto na ação, como se ninguém fosse tão vil quanto eu, e como se houvesse cometido os mesmos pecados, ou tivesse as mesmas enfermidades ou faltas que os outros; e que não deixarei que o conhecimento de suas faltas promova nada em mim, senão vergonha, e que se provem apenas como ocasião para minha confissão de meus próprios pecados e misérias a Deus. Vid. 30 de julho.
9. Resolvi, pensar bastante, em todas as ocasiões, sobre minha morte, e das circunstâncias comuns que a acompanham.
10. Resolvi, quando sentir dores, pensar nas dores do martírio, e do inferno.
11. Resolvi, quando pensar em alguma questão na teologia, a ser solucionada, imediatamente fazer o que puder em relação à solução, se as circunstâncias não impedirem.
12. Resolvi, se nisso tiver prazer como satisfação do orgulho, ou vaidade, ou por qualquer motivo semelhante, imediatamente deixar de lado.
13. Resolvi, esforçar-me para descobrir objetos idôneos de liberalidade e caridade.
14. Resolvi, nunca fazer algo por vingança.
15. Resolvi, nunca permitir mínimos movimentos de ira direcionados a seres irracionais.
16. Resolvi, nunca falar mal de ninguém, na medida em que isto tenderá para sua maior ou menor desonra, por nenhum motivo a não ser por algum bem real.
17. Resolvi, que viverei do modo pelo qual desejarei ter vivido quando vier a morrer.
18. Resolvi, viver de tal modo, a todo tempo, como achar ser o melhor nas minhas mais devotas disposições, e quando tenho as mais claras noções das coisas do evangelho e do outro mundo.
19. Resolvi, nunca fazer algo que temeria fazer se esperasse que não haveria mais de uma hora para que ouvisse a última trombeta.
20. Resolvi, manter a mais severa temperança no comer e no beber.
21. Resolvi, nunca fazer algo que, se visse em outra pessoa, me desse um justo motivo para desprezá-la, ou de alguma maneira ter pensamentos maldosos a respeito dela.
22. Resolvi, esforçar-me para obter para mim mesmo o máximo de felicidade possível no mundo vindouro, e isto com todo poder, força, vigor e veemência, até mesmo com violência [veja Mt 11:12, na ARC] de que seja capaz, ou que possa exercer sobre mim mesmo, de qualquer modo imaginável.
23. Resolvi, frequentemente tomar alguma ação deliberada, que parece improvável de ser realizada para a glória de Deus e rastreá-la de volta até às suas intenções, desígnios e propósitos originais; e se descobrir que não tenha sido para a glória de Deus, reputá-la como uma quebra da quarta Resolução.
24. Resolvi, quando fizer alguma ação patentemente maligna, traçá-la de volta até chegar a sua causa original; e, então, tanto lutar cuidadosamente para não mais realizá-la, quanto fazê-lo pela oração, com toda força contra a sua origem.
25. Resolvi, examinar, cuidadosa e constantemente o que há em mim que me faz, por pouco que seja, duvidar do amor de Deus; e, após esse exame, direcionar toda minha força contra isso.
26. Resolvi, lançar fora as coisas que descobrir abaterem minha segurança [da salvação].
27. Resolvi, nunca omitir algo voluntariamente, exceto se tal omissão for para a glória de Deus. Também resolvi examinar minhas omissões.
28. Resolvi, estudar as Escrituras tão constante, firme e frequentemente, a ponto de poder descobrir e claramente perceber a mim mesmo crescendo no conhecimento dela.
29. Resolvi nunca contar como uma oração, nem deixar passar por oração, nem ao menos como um pedido de oração o que for feito de tal modo que eu não possa esperar que Deus o responderá; nem como confissão algo que eu não espere que Deus aceitará.
30. Resolvi, lutar a cada semana para ser levado a um lugar mais alto na religião, e a um mais alto exercício da graça do que tive na semana anterior.
31. Resolvi, nunca dizer nada contra qualquer criatura, senão quando for perfeitamente coerente com o mais alto grau da honra cristã, e com o amor pela humanidade, e com a mais rebaixada humildade, e com o senso de minhas próprias faltas e falhas, e conforme à Regra de Ouro; sempre, quando tiver dito algo contra alguém, resolvi sondar rigorosamente a isto pelo teste desta Resolução.
32. Resolvi, ser rigorosa e firmemente fiel à minha crença, para que o disposto em Pv 20:6: “Mas o homem fidedigno, quem o achará?” não seja parcialmente cumprido em mim.
33. Resolvi, fazer o que puder para promover, manter e preservar a paz, quando isto puder ser feito sem um prejuízo correspondente em outros aspectos. 26 de dez. 1722.
34. Resolvi, nas narrativas, nunca falar senão o que for a pura e simples verdade.
35. Resolvi, a qualquer momento que questionar se fiz o que era meu dever fazer, de tal modo que minha paz e calma seja por isto perturbada, registrar isso, bem como por que maneira a questão foi resolvida. 18 de dez. 1722.
36. Resolvi, Nunca falar mal de ninguém, exceto se tiver um bom motivo em particular para isso. 19 de dez. 1722.
37. Resolvi, inquirir a cada noite, e quando for me deitar, em que fui negligente, - que pecado cometi, - e em que tenho negado a mim mesmo; isso também ao fim de cada semana, mês e ano. 22 e 26 de dez., 1722.
38. Resolvi, jamais proferir algo que seja cômico, ou matéria de riso, no Dia do Senhor. 23 de dez., 1722, Dia do Senhor, à noite.
39. Resolvi, nunca fazer algo de que eu questione a licitude, ou que pretenda, ao mesmo tempo, considerar e examinar posteriormente se aquilo é lícito ou não; a menos que eu questione a licitude da omissão.
40. Resolvi, inquirir, toda noite antes de ir dormir, se agi do melhor modo possível, com respeito ao comer e ao beber. 7 de jan. 1723.
41. Resolvi, perguntar a mim mesmo, ao final de cada dia, semana, mês e ano, em que poderia, de algum modo, ter agido melhor. 11 de jan., 1723.
42. Resolvi, frequentemente renovar a minha dedicação a Deus, que foi feita no meu batismo, e que solenemente renovei quando fui recebido na comunhão da igreja, e que solenemente refiz nesta data de 12 de janeiro de 1723.
43. Resolvi, nunca, daqui por diante, até eu morrer, agir como se pertencesse de algum modo a mim mesmo, mas sim inteira e totalmente a Deus. Sábado, 12 de jan., 1723.
44. Resolvi, que nenhum outro fim senão o da religião terá alguma influência em quaisquer de minhas ações; e que não tomarei nenhuma atitude, em circunstância alguma, senão a que tenha como propósito a religião. 12 de janeiro, 1723.
45. Resolvi, nunca permitir qualquer prazer ou dor, alegria ou luto, nem afeição alguma, nem qualquer grau de afeição, nem qualquer circunstância a ela relacionada, senão o que for favorável à religião. 12 e 13 de jan., 1723.
46. Resolvi, jamais permitir a menor medida de preocupação ou inquietação a meu pai ou mãe. Resolvi, não permitir também os efeitos disso, até mesmo a menor alteração da fala, ou movimento dos meus olhos; e também a ser especialmente cuidadoso nisso com relação aos demais membros de nossa família.
47. Resolvi, me esforçar ao máximo para negar tudo o que não seja condizente com um temperamento totalmente doce e benevolente, tranquilo, pacífico, contente e relaxado, compassivo e generoso, humilde e manso, submisso e bondoso, diligente e frutífero, caridoso e mesmo paciente, moderado, perdoador e sincero. Resolvi fazer, a todo tempo, o que tal temperamento me conduzir a fazer; e examinar estritamente, ao final de cada semana, se assim o tenho feito. Na manhã do Dia do Senhor. 5 de maio, 1723.
48. Resolvi, constantemente, com máxima cortesia e diligência, e o mais severo escrutínio, investigar o estado de minha alma, para que saiba se verdadeiramente tenho um interesse em Cristo ou não; para que, quando vier a morrer, não tenha nenhuma negligência nesse assunto de que possa me arrepender. 26 de maio, 1723.
49. Resolvi, que isso [o exposto na Resolução anterior] jamais ocorrerá, se puder evitá-lo.
50. Resolvi que agirei do modo que pensar ter sido o melhor e mais prudente, quando chegar ao mundo porvir. 5 de julho, 1723.
51. Resolvi que agirei de tal modo, em todo os aspectos, do modo que desejaria ter agido, se ao fim viesse a ser condenado. 8 de julho, 1723.
52. Frequentemente ouço pessoas idosas dizerem como viveriam, se pudessem viver suas vidas novamente: Resolvi, que viverei de tal maneira como puder pensar ter desejado viver, supondo que viva até à velhice. 8 de julho, 1723.
53. Resolvi, aproveitar cada oportunidade, quando estiver em minhas melhores e mais felizes disposições de mente, para lançar e aventurar minha alma ao Senhor Jesus Cristo, confiar e entregar-me, e consagrar-me inteiramente a ele; para que por esse modo possa estar certo de minha segurança, sabendo que confio em meu Redentor. 8 de julho, 1723.
54. Resolvi, que quando ouvir algo falado favoravelmente de alguma pessoa, se achar que isso seria louvável em mim, esforçar-me para imitá-la. 8 de julho, 1723.
55. Resolvi, esforçar-me ao máximo para agir como puder pensar que o faria, se já houvesse visto a felicidade do céu e os tormentos do inferno. 8 de julho, 1723.
56. Resolvi, nunca abandonar, e, nem sequer por um instante, negligenciar minha luta contra minhas corrupções, independentemente das derrotas que sofra.
57. Resolvi, quando sentir as desgraças e adversidades, examinar se fiz o meu dever, e resolver fazê-lo e deixar que o evento ocorra como a Providência o ordenar. Não irei, até onde puder, me preocupar com nada, a não ser com meu dever e meu pecado. 9 de junho, e 13 de julho, 1723.
58. Resolvi, não apenas me refrear de uma aparência de desgosto, petulância e ira na conversação, mas exibir um ar de amor, alegria e benignidade. 27 de maio e 13 de julho, 1723.
59. Resolvi, quando estiver mais consciente das provocações à uma disposição irritada e à ira, que lutarei o máximo para me sentir e agir de boa vontade; sim, nesses momentos, resolvi manifestar boa natureza, embora pense que em outros aspectos isso seria desvantajoso, do mesmo modo que poderia ser imprudente em outras ocasiões. 12 de maio, 11 e 13 de julho.
60. Resolvi, quando meus sentimentos começarem a parecer, por pouco que seja, desordenados, quando estiver cônscio da menor inquietude interior, ou da menor irregularidade exterior, então me submeterei ao mais estrito exame. 4 e 13 de julho, 1723.
61. Resolvi, que não darei lugar àquela torpeza que descubro afrouxar e relaxar minha mente de estar plena e fixamente colocada na religião, seja qual for a desculpa que para isso tenha, ao pensar que o que minha torpeza me inclinar a fazer é o melhor a ser feito, e coisas semelhantes. 21 de maio e 13 de julho, 1723.
62. Resolvi, nada fazer senão o que for meu dever, e, de acordo com Ef 6:6-8 [não servindo à vista, como para agradar a homens, mas como servos de Cristo, fazendo, de coração, a vontade de Deus;  7 servindo de boa vontade, como ao Senhor e não como a homens,  8 certos de que cada um, se fizer alguma coisa boa, receberá isso outra vez do Senhor, quer seja servo, quer livre.], fazê-lo alegre e voluntariamente, como ao Senhor e não a homens: sabendo que qualquer boa coisa que o homem faz, o mesmo se receberá do Senhor. 25 de junho e 13 de julho, 1723.
63. Na hipótese de que jamais houve um indivíduo no mundo, a qualquer tempo, que foi propriamente um cristão completo, que tenha sido em todos os aspectos de um caráter justo, tendo o cristianismo sempre brilhando em seu verdadeiro esplendor, e mostrando-se excelente e amável, de qualquer parte e ângulo observado: Resolvi, agir de tal maneira que lute com todas as minhas forças para ser esse cristão, ainda que seja o único de minha época. 14 de jan. e 13 de jun., 1723.
64. Resolvi, quando descobrir aqueles “gemidos inexprimíveis”, de que fala o apóstolo, e o que fala o salmista sobre “consumida está a minha alma por desejar”, que irei promovê-los com o máximo de minhas forças; e que não serei remisso em prontamente me esforçar para liberar meus desejos; nem deixarei de perseverar nesse sentido. 23 de jul. e 10 de ago., 1723.
65. Resolvi, nisto me exercitar, por toda a minha vida, isto é, com a maior abertura de que seja capaz, declarar meus caminhos a Deus, e abrir minha alma para ele: todos os meus pecados, tentações, dificuldades, dores, esperanças, desejos, e tudo, e cada circunstância, de acordo com o sermão do Dr. [Thomas] Manton no salmo 119. 26 de jul. e 10 de ago., 1723.
66. Resolvi, que me esforçarei sempre para manter um aspecto benigno, no agir e no falar, em todos os lugares, e em todas as companhias, exceto se meu dever exigir que faça o contrário.
67. Resolvi, após aflições, inquirir elas me trouxeram de bom, e o que poderia ter obtido delas.
68. Resolvi, confessar francamente a mim mesmo tudo o que achar em mim, quer de enfermidade ou pecado; e, se isto também se relacionar à religião, também confessar tudo a Deus, e implorar o seu auxílio. 23 de jul. e 10 de ago., 1723.
69. Resolvi, sempre fazer aquilo que desejaria ter feito quando vir outros realizando. 11 de ago. 1723.
70. Que sempre haja algo benevolente em tudo o que eu falar. 17 de agosto de 1723.

Estas foram as excelentes Resoluções tomadas por Jonathan Edwards em um período precoce de sua vida, e que foram posteriormente encaradas por ele não como registros menos importantes, mas como contendo os maiores princípios de sua vida espiritual. Um profundo e extenso conhecimento do coração é manifesto nessas Resoluções; uma convicção de seus defeitos; uma vívida apreensão de seus perigos; e um intenso cuidado de que todas as suas inclinações fossem em direção a Deus, e a toda coisa exigida pela sua santa vontade. Há uma notável ternura de consciência descoberta em cada exemplo que foi declarado. O homem que pôde assim escrever não era alguém que poderia facilmente menosprezar o pecado, ou que poderia adentrar em qualquer de seus caminhos sem a imediata reprovação de uma consciência ofendida. Este santo homem tremia mesmo ao contemplar à distância o pecado; não poderia voluntariamente se aproximar e contemplar suas seduções. Acostumado a respirar uma atmosfera santa, a menor nuvem de corrupção imediatamente afetava sua disposição espiritual. Não conhecia felicidade senão a que estava conectada com uma consciência vazia de ofensa. Todas estas regras eram as sugestões da consciência de um caráter altamente iluminado. Também indicam um senso constante da presença e das observações exatas do Perscrutador de todos os corações. Ele vivia como se visse o que é invisível; tinha o Senhor sempre diante de si, o encorajando em todas as ocasiões para um ávido zelo pela glória de Deus, o objeto maior para o qual desejava viver tanto na terra quanto no céu, objeto que quando era comparado a todas as outras coisas à sua vista elas nada mais eram do que ninharias. Se isso era alcançado, todos os seus desejos eram satisfeitos; mas se era perdido, ou alcançado imperfeitamente, sua alma se enchia de angústia. Essas Resoluções dão amplo testemunho do quanto o autor adentrou no espírito de 1 Co 10:31: “Quer comais, quer bebais, quer façais qualquer outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus.” Também ilustram suas opiniões sobre a importância da consistência do caráter. Ele não se contentava com visões corretas da verdade, ou qualquer tipo de profissão exterior, aparte da santa consistência de caráter. Estudava, admirava e exibia a influência do evangelho; um andar “digno da vocação para a qual foi chamado” era o objeto elevado ao qual ardentemente aspirava. Ele bem sabia que se requer dos seguidores de Cristo que “preservem a palavra da vida,” que brilhem como luzeiros do mundo, que instruam pelos seus exemplos bem como por suas palavras; e desejava honrar a Deus apresentando aos membros do reino espiritual, e também ao mundo, um modelo que pudesse declarar a realidade e beleza da religião. Além disso, é manifesto a partir destas Resoluções, que sua mente era muito ansiosa para avançar diariamente em cada ramo da santidade. Havia nele um princípio espiritual ativo, que o fazia romper com todos os obstáculos do caminho. Não conseguia se contentar quando ainda restava nele um pecado, enquanto uma graça estava em falta, ou um mero dever realizado, porém imperfeitamente. Aspirava pela santa perfeição do mundo celestial, e antecipava com alegria aquele dia em que despertaria com a semelhança divina. Não é surpresa que, com estes sentimentos e opiniões tenha alcançado um caráter exaltado raramente igualado e talvez nunca superado.

As Resoluções que deram ensejo a estas reflexões são provavelmente “para pessoas de qualquer idade, mas em especial para as jovens, o melhor resumo não inspirado do dever cristão, a melhor instrução para altas realizações na virtude evangélica, que a mente humana até aqui foi capaz de formar.” Elas desvendam o próprio caráter de seu autor, e são admiravelmente calculadas para aprimorar o caráter de todo leitor que teme o pecado, e se regozija na pureza da vontade Divina.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

MEMÓRIAS DE JONATHAN EDWARDS - CAP. 2

CAPÍTULO 2
PROGRESSO INTELECTUAL – PRODUÇÕES INICIAIS – ENTRADA NA FACULDADE – HÁBITOS MENTAIS
Por Sereno E. Dwight
Uma declaração foi dada principalmente da pena do próprio Sr. Edwards sobre suas perspectivas religiosas na juventude, e será apropriado, antes que esse assunto seja retomado, fazer referência a seus progressos intelectuais no mesmo período. É deleitoso contemplar o avanço simultâneo do conhecimento na mente e da piedade no coração. Ninguém pode sensatamente imaginar que haja uma oposição entre estas coisas. Todos cujas mentes estiverem abertas ao convencimento serão persuadidos de que o crescimento da piedade é muito favorável ao aumento dos melhores tesouros da sabedoria terrena. A religião fortalece os poderes [intelectuais] do homem, nunca os debilita. Ela corta, de imediato, aqueles prazeres culposos, e aquelas buscas indignas, que não meramente impedem o progresso do entendimento, mas, em muitos casos, são absolutamente fatais para a sua vivacidade. E ela forma aqueles hábitos mentais, bem como produz essa conduta correta exterior, que são muito favoráveis ao cultivo das mais nobres faculdades do homem. Seria fácil recordar uma extensa lista de nomes matriculados, com honra incessante, tanto nas escolas da ciência quanto na igreja de Deus. O evangelho de Cristo tem sido uniformemente amigo do conhecimento sólido, e aqueles que se dispõem a criticar os esforços e habilidades do intelecto não são amigos sensatos do evangelho. A igreja cristã teme o véu da escuridão, mas se regozija na luz.
A mesma bondade e sabedoria paternal que, abaixo de Deus, guiaram a mente de Jonathan Edwards ao conhecimento e amor das coisas eternas, também foram bastante determinadas na orientação de seus poderes intelectuais para os objetos úteis da ciência terrena. Quando tinha apenas seis anos, o estudo do latim ocupou sua atenção, sob os cuidados de seu pai, e, ocasionalmente, de suas irmãs mais velhas. Nenhum registro foi preservado de seu progresso nos estudos nesse período inicial, mas sua alta posição como erudito em sua admissão à faculdade, bem como posteriormente, e seu conhecimento exaustivo do latim, grego e hebraico, provam de imediato sua própria diligência como estudante neste tempo, e a acurácia e fidelidade das instruções de seu pai.
“De seus manuscritos remanescentes, é evidente que a família de seu pai era afeiçoada à escrita, e que ele e suas irmãs foram encorajados desde cedo por seus pais para fazerem tentativas, não apenas na escrita de cartas, mas em outras espécies de composição. Esse costume, embora raramente estimulado nas crianças, é altamente vantajoso; e, no caso diante de nós, foi obviamente seguido dos melhores resultados. Enquanto aumentava a afeição mútua entre o irmão e as irmãs, também servia para fortalecer suas mentes, e comunicar a precisão tanto de pensamento quanto de expressão. O mais antigo esforço de sua pena parece ter sido escrito na seguinte ocasião.
Alguém da vizinhança, provavelmente um garoto mais velho, tinha sustentado a opinião de que a alma era material, e permanecia com o corpo até à ressurreição. Essa pessoa se esforçou para convencê-lo de que estava correta. Impactado pelo absurdo da noção, ele se sentou e escreveu a seguinte réplica, a qual, como uma ilustração tanto de sutileza quanto de raciocínio em uma criança com cerca de dez anos, pode, com justiça, reclamar ser preservada. Está sem data, e sem pontuação, ou qualquer divisão em sentenças. E parece ter sido escrita por um garoto que acabou de aprender a escrever.
“Fui informado de que você apresentou uma opinião de que a alma é material, e acompanha o corpo até a ressurreição. Como eu sou um amante professo de novidades, você deve imaginar que estou muito alegre com esta descoberta (que, ainda que seja antiga em algumas partes do mundo, para nós é novidade); mas, tolere um pouco mais minha curiosidade, pois quero saber os costumes do reino antes que jure lealdade a ele: Primeiro, quero saber se esta alma material permanece (com o corpo) no caixão, e se sim, não seria conveniente construir um depósito para ela? Para isso, queria saber que forma ela teria, se seria redonda, triangular, ou quadrada; ou se é um número de cordas longas e finas alcançando da cabeça ao pé; e se não vive uma vida muito descontente. Temo que, quando o caixão ceder, a terra cairá e a esmagará; mas se escolher viver acima do solo, e vagar em volta do túmulo, de que tamanho ela seria? Se ela cobre todo o corpo, o que acontece quando outro corpo é posto sobre ela? se a primeira dá lugar, e, se for assim, qual é o seu lugar de refúgio? Mas suponha que as almas não são tão grandes, mas que dez ou doze delas sejam aproximadamente do tamanho de um corpo, não irão brigar pelo lugar mais elevado? E, uma vez que insisto tanto em minha honra e propriedade, quero saber se devo abrir mão de minha querida cabeça, se uma alma superior vem no caminho. Mas, acima de tudo, me preocupo em saber o que fazem onde um cemitério for ocupado vinte, trinta ou cem vezes. Se estiverem uma em cima das outras, a que estiver na posição superior estará tão distante que não poderá ter cuidado do corpo. Suspeito fortemente que elas devem marchar todas as vezes que vem um novo grupo. Espero que haja outro lugar providenciado para elas que não seja o pó. Padecer tanta severidade, e ser, no fim, privado do corpo, as irritaria. Deixo isso para que seu gênio físico determine, se alguma aplicação medicinal não seria apropriada em tais casos, e me farei seu prosélito, quando eu tiver uma solução para tais questões.”
A seguinte carta para uma de suas irmãs, escrita na idade de doze anos, é o mais antigo esforço datado de sua pena que foi descoberto.

Para a senhorita Mary Edwards, em Hadley.
Windsor, 10 de maio de 1976.
Querida irmã,
Pela maravilhosa bondade e misericórdia de Deus, houve um derramamento muito notável neste lugar do Espírito de Deus. Ainda continua, mas acho que tenho razão em pensar que diminuiu em alguma medida, contudo espero que não tanto. Três [pessoas] se juntaram à igreja desde as últimas que você ouviu. Cinco agora permanecem aconselhadas para a admissão, e acho que mais de trinta pessoas vêm comumente às segundas para conversar com meu pai sobre a condição de suas almas. É tempo de saúde em geral aqui. Abigail, Hannah e Lucy tiveram catapora e estão recuperadas. Jerusha está quase bem. À exceção dela, toda a família está bem.
Irmã, estou feliz de ouvir do seu bem estar com tanta frequência quanto ouço. Ficaria feliz de ouvir de você por carta, e, nela, como você está com relação à torção.
De seu amoroso irmão,
Jonathan e.

Até que entrou na faculdade, foi educado em casa, e sob a instrução pessoal de seu pai; enquanto suas irmãs mais velhas estavam diariamente perseguindo seus respectivos ramos de estudo em sua presença imediata. Seu pai, tendo se distinguido como um erudito, foi capaz de lhes dar, e realmente lhes deu, uma educação superior. Em tudo que elas se interessavam, a mente de seu irmão, enquanto se abria, também, é claro, ficava mais e mais interessada. E assim, por fim, ele iria fácil e imperceptivelmente adquirir uma massa de informação muito avançada para sua idade.  O curso de sua educação pode, deste modo, ter sido menos sistemático, de fato, menos conforme a regra, do que o seguido comumente na escola. Ao mesmo tempo era mais seguro, formando-o para costumes mais delicados, sentimentos mais gentis, e afeições mais puras. Em suas circunstâncias, também, esta educação foi obviamente mais compreensiva e geral; e, na medida em que o familiarizou com muitas coisas que não são usualmente comunicadas até um período posterior, também serviu para descortinar os atributos originais de sua mente, e dar-lhes aquela expansão, que é resultado apenas da informação. Uma característica, da qual geralmente não se suspeitou nele, mas que possuía em um grau incomum, era uma paixão minuciosa e crítica para investigar as obras da natureza. Esta propensão não foi apenas descoberta na juventude e idade adulta, mas foi plenamente desenvolvida na infância, e nesse precoce período foi encorajada e acalentada pela mão protetora do cuidado paternal.    
Ele entrou na faculdade de Yale, em New-Haven, em setembro de 1716, antes que completasse treze anos de idade. A faculdade estava então em sua infância, e várias circunstâncias adversas tinham grandemente impedido seu crescimento. Primeiro havia sido plantada em Saybrook, e depois removida parcialmente para Kenilworth, para a casa do primeiro reitor, até sua morte, em 1707. Desde esse tempo, o Rev. Sr. Andrews, de Milford, um dos curadores, se tornou reitor pro tempore, por mais de doze anos. A localização da faculdade era tema constante de contendas entre as cidades de New-Haven, Saybrook, Wethersfield e Hartford, até 1716, quando o voto dos curadores, a doação do Sr. Yale, e o voto do legislativo da colônia, fixou-a permanentemente em New-Haven. No ano colegial de 1716-1717, treze dos alunos residiam em New-Haven, catorze em Wethersfield e quatro em Saybrook. A presidência temporária do Sr. Andrews se estendeu até 1719; e, uma vez que ele era o ministro atuante de Milford, sua supervisão da faculdade, e sua influência sobre os alunos, deve, é claro, ter sido bastante imperfeita. O governo da instituição, virtual e necessariamente, estava principalmente nas mãos dos tutores que, como jovens sem experiência e conhecimento da humanidade, não poderiam geralmente ser achados aptos para tão difícil encargo. Em algum período no ano de 1717, a extrema impopularidade de um dos tutores ocasionou uma insurreição geral dos alunos que residiam em New-Haven, contra o governo da faculdade. Eles se retiraram, à uma, de New-Haven, e se juntaram aos seus companheiros em Wethersfield. No começo daquele ano, oito dos veteranos retornaram a New-Haven para receber seus graus do governo regular da faculdade; enquanto que cinco os receberam irregularmente em Wethersfield. Não há evidência de que Jonathan Edwards tomou parte nestes distúrbios. Contudo, ele se dirigiu com seus companheiros para Wethersfield, lá permanecendo até 1719. Enquanto estava lá, adquiriu uma alta reputação e proeminência em sua classe. Seu pais, escrevendo a uma de suas filhas, em 27 de janeiro de 1718, diz: “Nada ouvi senão que seu irmão Jonathan também está bem. Ele tem um nome muito bom em Wethersfield, tanto em relação a sua conduta quanto ao aprendizado.” Enquanto esteve em Wethersfield, ele escreveu a uma de suas irmãs a seguinte carta; a qual, como documento relacionado a um interessante evento na história da faculdade, não sem razão deve ser preservado.

Para a senhorita Mary Edwards, em Northampton.
Wethersfield, 26 de março de 1719
Querida irmã,
De todas as muitas irmãs que tenho, acho que nunca fiquei tanto tempo sem ouvir notícias de uma quanto de você, visto que não consigo lembrar se já ouvi um i ou j de você, desde a última vez que foi para o norte,    até a última semana, pelo Sr. B., que veio de Northampton.  Quando ele chegou, me alegrei de verdade em vê-lo, porque esperava muito receber uma carta sua por meio dele. Mas sendo desapontado, e não pouco, me dispus a escrever esta, que esperava fosse uma oportunidade de receber o mesmo. Pois eu pensei que seria uma pena que não houvesse a mínima correspondência entre nós, ou comunicação de um com o outro, quando não estamos a tão grande distância. Também espero que isto seja um meio para incitar a mesma [disposição] em você. E assim, tendo mais caridade por você a ponto de acreditar que eu esteja fora de sua mente, ou de que não se preocupe nem um pouco comigo, acho adequado que eu deva lhe dar um relato de minha condição, relativa à escola. Suponho que esteja plenamente familiarizada com nossa vinda de New-Haven, e as circunstâncias dela. Desde então, estamos em mais prósperas condições, penso, do que nunca. Mas o conselho e os curadores, havendo se reunido recentemente em New-Haven, com relação a esta [questão], removeram aquele que foi a causa de nossa vinda, isto é, o Sr. Johnson, do cargo de tutor, e designaram o Sr. Cutler, pastor de Canterbury, como presidente. Este, conforme ouvimos, pretende muito rapidamente ser residente na faculdade Yale, de modo que todos os estudantes que pertencem a nossa escola esperam para lá retornar, tão logo cesse as férias de depois da eleição.
Sou seu amoroso irmão, em boa saúde,
Jonathan Edwards

Enquanto era um membro da faculdade, ele se distinguiu pela constante sobriedade e retidão de comportamento, pela diligente aplicação a seus estudos, e por rápidas e completas realizações no aprendizado. No segundo ano de seu curso, enquanto ainda estava em Wethersfield, leu [a obra de John] Locke sobre o Entendimento Humano, com deleite peculiar. A força incomum e o alcance de sua mente começou a ser descoberto e exercitado mesmo nesta idade precoce. De seu próprio relato da matéria, ele ficou inexprimivelmente entretido e deliciado com essa profunda obra, quando a leu na idade de catorze anos, experimentando um prazer muito mais elevado na investigação de suas páginas “do que os mais ambiciosos avarentos têm, quando reúnem nas mãos prata e ouro, advindos de um tesouro recém-descoberto.” A estudos desta espécie ele se dedicou desde esse tempo, como os que sentia mais intenso interesse. Contudo, ainda se aplicava com muita diligência e sucesso na realização de seus deveres designados, a ponto de sustentar o primeiro lugar em sua classe, e assegurar a mais alta aprovação de seus instrutores.
O Sr. Cutler foi a New-Haven no início de junho de 1719, na abertura do semestre de verão, para assumir os deveres de seu cargo de reitor; e os alunos, entre os quais estava Jonathan Edwards, retornaram para a faculdade. A seguinte carta do reitor para seu pai mostrará o caráter que tinha assumido em Wethersfield, e as circunstâncias tensas da faculdade.

New-Haven, 30 de junho de 1719.
Rev. Senhor,
Sua carta me veio às mãos pelo seu filho. Parabenizo-o pelas suas habilidades e avanços promissores no aprendizado. Ele está agora sob meu cuidado, e é provável que assim continue, e sem dúvidas continuará, se permanecer aqui, e eu for estabelecido no posto que agora me encontro. Posso assegurá-lo, Rev. Senhor, que sua boa afeição para comigo neste assunto, e a dos ministros a sua volta, não me é pequeno incentivo. Se eu perseverar nisto, será um forte motivo para aprimorar minhas pobres habilidades no serviço de jovens tão promissores quanto os que conosco estão. Eles devem suportar bastante minha debilidade, mas não minha negligência. Não sou um político, mas conduzirei toda a faculdade com uma mão justa e com afeição. E não duvido que a dificuldade e a importância do assunto me assegurarão as suas orações, e de todos os homens de bem, as quais tanto prezo e desejo.
Permaneço, na mais pronta esperança e expectativa de suas orações,
Seu humilde servo
T. Cutler.

A seguinte carta característica, escrita para seu pai no seu terceiro ano na faculdade, não será de pouco interesse para o leitor.

Para o Rev. Timothy Edwards, Pastor da igreja em East Windsor.
New-Haven, 21 de julho de 1719
Honrado senhor,
Recebi, com dois livros, uma carta sua, datada de 7 de julho, e nela recebi, com a maior gratidão, seu inteiro conselho e ensino. Espero que, com a ajuda de Deus, use meus maiores esforços para pô-los em prática. Estou sensível da preciosidade do meu tempo, e estou resolvido que não seja por nenhuma negligência minha se ele se perder sem o seu maior aproveitamento. Estou com bastante conteúdo na minha presente tutoria, assim como todo o restante dos estudantes parece estar com a deles. O Sr. Cutler é extraordinariamente cortês conosco, tem um ótimo espírito de governo, mantém a escola em excelente ordem, parece crescer em aprendizado, é amado e respeitado por todos que lhe são subordinados, e quando falam dele na escola ou na cidade, em geral o tratam pelo título de Presidente. Os estudantes todos vivem em paz com o povo da cidade, e não há uma palavra dita acerca de nossa postura anterior, exceto aqui e ali pela tia Mather. Tenho diligentemente pesquisado sobre as circunstâncias do exame [admissional] de Stiles, que foi muito curto, e, até onde eu posso entender, não foi desvantajoso para ninguém que ele tenha sido examinado acerca das Orações de Túlio [Cícero]. Neste [exame], embora ele jamais houvesse feito interpretações antes que viesse a New-Haven, não cometeu nenhum erro neste ou em qualquer outro livro, quer latino, grego ou hebraico, exceto em Virgílio, onde não pôde dizer o preteritum de requiesco. Ele é muito bem tratado entre os estudantes, e aceito na faculdade como membro dela por todos, e também como um calouro; nem, penso eu, é ele inferior quanto ao aprendizado a quaisquer de seus colegas de classe. Questionei o Sr. Cutler acerca de que livros teremos necessidade no próximo ano. Ele respondeu que eu teria que correr contra o tempo [para obter] a Geometria de Alstead e a Astronomia de Gassendus; com as quais lhe rogo que adquira um par de transferidores, ou compassos matemáticos, e uma escala, que são absolutamente necessários para se aprender matemática. Também [preciso] da Arte de Pensar, que, estou persuadido, não seria menos profícua que os outros que são necessários para mim, que sou
Seu muito respeitoso filho,
Jonathan Edwards.
P. S. O que doamos por semana para nossa direção é 5 libras.”

Os hábitos de estudo, que Edwards formou na mais precoce juventude, eram não apenas estritos e severos, e isto em cada ramo da literatura, mas em um aspecto eram singulares. Mesmo quando garoto, ele começou a estudar com a caneta na mão; não com o propósito de copiar os pensamentos dos outros, mas sim de escrever e preservar os pensamentos sugeridos à sua própria mente, a partir do curso de estudo que estava seguindo. Ele iniciou esta prática muito útil em diversos ramos de estudo muito cedo, e continuamente a seguiu em todos os seus estudos durante a vida. Sua pena parece ter estado, em certo sentido, sempre em suas mãos. Desta prática, na qual perseverou continuamente, ele derivou as próprias grandes vantagens de pensar continuamente durante cada período de estudo; de pensar acuradamente; de pensar conectadamente; de pensar habitualmente, em todo tempo; de banir de sua mente todo assunto que não fosse digno de pensamento contínuo e sistemático; de seguir cada objeto de pensamento dado até onde fosse capaz, no feliz momento quando abria se espontaneamente sobre sua mente; de seguir cada assunto posteriormente, em sequência regular, começando novamente do ponto onde havia previamente parado, quando novamente a questão se abria para ele em alguma nova e interessante luz; de preservar seus melhores pensamentos, associações e imagens, e então arranjá-los em seus tópicos apropriados, prontos para uso subsequente; de regularmente fortalecer a faculdade do pensamento e raciocínio por meio de exercício  constante e poderoso; e, acima de tudo, de gradualmente moldar a si mesmo em um ser pensante – um ser que, ao invés de encarar o pensamento e o raciocínio como labor, não podia achar diversão mais elevada senão no pensamento intenso, sistemático e correto.

Nesta visão do assunto, quando lembramos quão poucos estudantes comparativamente, por falta de disciplina mental, ao menos pensam; quão poucos dos que ao menos pensam, pensam habitualmente; quão poucos dos que pensam habitualmente o fazem com propósito; e quão poucos dos que pensam com propósito alcançam a plenitude da medida da estatura, a qual, como seres pensantes, poderiam alcançar; não será motivos de dúvidas que a prática em questão foi o meio principal para o desenvolvimento último de sua superioridade mental.”

domingo, 11 de maio de 2014

MEMÓRIAS DE JONATHAN EDWARDS - CAP. 1

CAPÍTULO 1
NASCIMENTO – PARENTESCO – PRIMEIROS AVANÇOS RELIGIOSOS – SÉRIAS IMPRESSÕES E RELATO DE SUA EXPERIÊNCIA
Por Sereno E. Dwight

Poucos indivíduos já apareceram na igreja de Deus que mereceram, e, de fato, receberam, mais altos tributos de respeito do que Jonathan Edwards. Seus poderes intelectuais eram incomuns, e sua diligência no cultivo desses poderes está fortemente marcada nessa vasta extensão da maior parte do conhecimento que ele possuía. Se o considerarmos como se igualando a Hartley, Locke e Bacon, na escala do intelecto, pouco temos a temer de que sua habilitação a tal distinção seja contestada. Sua mente poderosa captava com facilidade aqueles assuntos nos quais outros falhavam. Ele via a verdade quase intuitivamente, e era igualmente afiado na detecção do erro em todos os seus variados contornos. Este homem distinto reivindica admiração, não meramente com base na força incomum dos poderes intelectuais, e pela intensa aplicação da mente, recompensada com realizações proporcionais, mas também como um servo muito humilde e devoto de Cristo. Trazia tudo o que havia recebido ao seu serviço, e vivia apenas para Ele. Sua alma era, de fato, um templo do Espírito Santo, e sua vida manifestava uniformemente toda a simplicidade, pureza, desinteresse e o caráter elevado do evangelho de Cristo. A glória de Deus era seu objeto supremo, seja quando ocupado em seus exercícios devocionais, seus estudos, suas relações sociais, o ofício de seu ministério pastoral, ou nas publicações de seus escritos. Todos os motivos inferiores parecem não ter tido qualquer influência detectável sobre ele. Enquadrava-se plenamente na linguagem expressiva de Paulo: “Pois o amor de Cristo nos constrange,” “Para mim, o viver é Cristo.” Seu exemplo pessoal instruirá, animará e encorajará por muito tempo, e seus escritos necessariamente serão muito altamente estimados enquanto prevalecer o amor pela verdade.
Foi com justiça observado que: “O número daqueles homens que produziram grandes e permanentes mudanças no caráter e condição da humanidade, e estamparam sua própria imagem nas mentes das gerações subsequentes, é comparativamente pequeno. E, até mesmo desse pequeno número, o grosso deve sua superior eficiência, ao menos em parte, a circunstâncias externas, enquanto que a muitos poucos pode-se atribuí-lo à simples força do próprio intelecto. Contudo, aqui e ali, pode-se achar um indivíduo que, pela sua mera energia mental, mudou o curso do pensamento e sentimento humano, e conduziu a humanidade adiante nesse novo e melhor caminho que abriu para a sua vista. Jonathan Edwards  foi um desses indivíduos. Nascido em uma colônia obscura, no meio de um ermo, e educado em um seminário que dava seus primeiros passos, passou a melhor parte de sua vida como pastor de uma vila fronteiriça, e o restante como missionário para os índios, em um acampamento ainda mais humilde. Ele descobriu, e desvendou um sistema do governo moral divino tão novo, tão claro, tão pleno, que, logo na sua primeira revelação, nem necessitou de algum auxílio de seus amigos, nem temeu oposição alguma de seus inimigos, e, por fim, constrangeu um mundo relutante a se curvar em cortesia à sua verdade.”
Jonathan Edwards nasceu no dia 5 de outubro de 1703, em Windsor, às margens do [Rio] Connecticut. Seu pai, o Rev. Timothy Edwards, era pastor daquele lugar há cerca de 60 anos. Timothy Edwards morreu em janeiro de 1758, aos 89 anos de idade, menos de dois meses antes de seu único filho. Era um homem de grande piedade e prática. No dia 6 de novembro de 1694, casara-se com Esther Stoddard, filha do reverenciado e celebrado Solomon Stoddard, de Northampton, quando esta tinha 23 anos. Viveram juntos como casados por mais de 63 anos. A Sra. Edwards, mãe de nosso autor, nascera em 2 de julho de 1672, e viveu até quase os noventa anos de idade, (alguns anos a mais que seu filho); um exemplo notável de pouca perda dos poderes mentais em tão avançada idade. Este venerável casal teve onze filhos: um homem, o objeto destas memórias, e dez mulheres, quatro das quais eram mais velhas, e seis mais novas que ele.
Devido ao caráter altamente espiritual e às realizações intelectuais de seus pais, se poderia naturalmente esperar que sua educação primária fosse acompanhada de vantagens incomuns. E assim aconteceu. Muitas foram as preces apresentadas pela afeição paternal para que esse único e amado filho pudesse ser cheio do Espírito Santo, que conhecesse desde a infância as Santas Escrituras e fosse grande aos olhos do Senhor. Aqueles que, com esse fervor e constância, o recomendavam a Deus, manifestavam igual diligência em treiná-lo para Deus. A oração estimulava a ação, e a ação, por seu turno, era novamente encorajada pela oração. O círculo doméstico era um cenário de súplica, e também de instrução. Na residência de tais servos exemplares de Deus, a instrução abundava. Aquilo que o olho via, bem como o que o ouvido ouvia, formava uma lição. Nada havia no exemplo dos que ensinavam que diminuísse a força da instrução. Nada havia nos hábitos sociais que fosse contrário às lições de sabedoria, e infundissem aqueles princípios que, após anos, produziam o fruto da tolice e do pecado. Ao contrário, havia tudo para alargar, purificar e elevar o coração, e ao mesmo tempo treinar a mente para aqueles exercícios do pensamento,  dos quais somente se podem esperar eminentes realizações.
As fiéis instruções religiosas de seus pais “o tornaram, quando criança, familiarmente íntimo com Deus e com Cristo, com seu próprio caráter e dever, com o caminho da salvação, e com a natureza daquela vida eterna que, começando na terra, é aperfeiçoada no céu.” Suas orações não foram esquecidas, e seus esforços não permaneceram sem efeito. No progresso da infância, ele foi, em diversos momentos, objeto de fortes impressões religiosas. “Isso foi particularmente verdadeiro alguns anos antes de ir para a faculdade, durante um poderoso reavivamento da religião na congregação de seu pai. Ele, e dois outros rapazes de sua idade, que tinham os mesmos sentimentos que ele, levantaram uma tenda em um lugar muito retirado, num pântano, para servir como lugar de oração, e se retiravam para ali para a oração social. Isso continuou por um longo período; mas as impressões, ao fim, desapareceram, e, em sua própria opinião, não foram seguidas por quaisquer efeitos permanentes de uma natureza salutar.”
O período exato quando considerou ter entrado na vida religiosa, não menciona em lugar algum, nem foi achado qualquer registro da época em que fez a pública profissão da religião. Até mesmo a igreja a qual se afiliou certamente não teria sido conhecida, não fora o fato de que, em uma ocasião, alude a si mesmo como membro da igreja em East Windsor. Baseado em várias circunstâncias, parece que o tempo em que se uniu a ela não foi muito distante da época de sua partida para a faculdade. Das opiniões e sentimentos de sua mente sobre esse assunto tão importante, tanto antes quanto após esse evento, há um relato bastante satisfatório e instrutivo que foi achado entre seus papéis, escritos por sua própria mão, cerca de vinte anos depois, para seu uso privado. É como se segue:
“Tive uma variedade de preocupações e exercícios acerca da minha alma desde a minha infância; mas tive duas temporadas mais notáveis de despertamento, antes que encontrasse com aquela mudança pela qual fui trazido a estas novas disposições, e a este novo senso das coisas, que tenho tido desde então.
A primeira vez foi quando eu era um garoto, alguns anos antes de ir para a faculdade, em uma época de notável despertamento na congregação de meu pai. Fui, então, profundamente afetado por muitos meses, e me preocupava com as coisas da religião, e com a salvação de minha alma e abundava nos deveres religiosos. Costumava orar em secreto, cinco vezes ao dia, e gastava muito tempo em conversas religiosas com outros garotos, e costumávamos nos encontrar para orarmos juntos. Experimentava não sei que tipo de deleite na religião. Minha mente muito se ocupava nisso, e tinha muito prazer na justiça própria, e era meu deleite abundar nos deveres religiosos. Eu, com alguns colegas de escola, nos ajuntamos e construímos uma tenda em um pântano, em um lugar bastante retirado, para servir como lugar de oração. Além disso, tinha lugares secretos particulares na floresta, para onde costumava me retirar, e era, de tempos em tempos, muito afetado. Minhas afeiçoes pareciam ser vívidas e facilmente movidas, e eu parecia estar em meu momento mais feliz quando me ocupava nos deveres religiosos. Estou pronto a pensar que muitos são enganados com essas afeições, e com esse tipo de deleite, como então eu tinha na religião, e o confundem com a graça.
Mas, com o passar do tempo, minhas convicções e afeições se deterioraram, e eu perdi inteiramente todas aquelas afeições e deleites, e abandonei a oração secreta, ao menos quanto a qualquer preferência constante por ela. Retornei como um cão ao seu vômito, e continuei nos caminhos do pecado. Na realidade, às vezes me sentia muito incomodado, especialmente na última parte do meu tempo na faculdade, quando agradou a Deus me atingir com a pleurisia [infecção das pleuras pulmonares], com a qual me trouxe à beira do túmulo, e me sacudiu sobre o abismo do inferno. E não demorou muito tempo após minha recuperação, antes que caísse novamente nos meus antigos caminhos de pecado. Mas Deus não permitiria que continuasse com aquela tranquilidade. Tinha grandes e violentas lutas interiores, até que, após muitos conflitos com as inclinações ímpias, repetidas resoluções e compromissos, com os quais me obrigava, por votos, a Deus, fui levado a romper completamente com todos os caminhos ímpios e com todas as formas de pecado exterior conhecidas, e a me aplicar na busca da salvação, e a praticar muitos deveres religiosos, mas sem aquele tipo de afeição e deleite que anteriormente tinha experimentado.
Minha preocupação agora gerava mais lutas e conflitos internos, e autorreflexão. Fiz da busca da salvação a principal ocupação da minha vida. Contudo, parece a mim que a buscava de um modo miserável, o que me fez algumas vezes desde então questionar se alguma vez produziu algo que fosse salvífico, estando pronto a duvidar se tal busca miserável alguma vez teve sucesso. Fui, realmente, levado à busca da salvação, de uma maneira inédita. Senti uma inclinação para romper com todas as coisas do mundo, para obter um interesse em Cristo. Minha preocupação continuava e prevalecia, com muitos pensamentos esforçados e lutas interiores. Contudo, nunca parecia ser apropriado expressar essa preocupação pelo nome de terror.
Desde a minha infância, minha mente esteve repleta de objeções contrárias à doutrina da soberania de Deus, em escolher os que quisesse para a vida eterna e rejeitar os que lhe agradasse, deixando-os perecer eternamente, e serem para todo o sempre atormentados no inferno. Costumava parecer uma doutrina horrível para mim. Mas, me lembro muito bem o tempo quando pareci estar convencido, e plenamente satisfeito quanto à soberania de Deus, e sua justiça em dispor desta maneira eternamente dos homens, de acordo com sua boa vontade soberana. Mas nunca consegui dar um relato de como, ou por quais meios, fui assim convencido, nem ao menos imaginar, à época, nem muito tempo depois, que houve uma extraordinária influencia do Espírito de Deus nisso. Somente que agora via mais longe, e minha razão apreendeu a justiça e razoabilidade disso. Contudo, minha descansou, e pôs um fim em todos aqueles sofismas e objeções.
E houve uma maravilhosa alteração em minha mente, com respeito à doutrina da soberania de Deus, daquele dia até hoje, de modo que eu raramente achei, desde então, sequer uma pequena objeção contraria, no sentido mais absoluto, ao fato de Deus mostrar misericórdia a quem ele tem misericórdia, e endurecer quem lhe apraz. A soberania e justiça absoluta de Deus, com respeito à salvação e condenação, é no que minha mente parece descansar segura, tanto quanto em qualquer coisa que vejo com meus olhos; ao menos é assim, às vezes. Mas tive, com frequência, desde essa primeira convicção, outro tipo de senso da soberania de Deus, diferente do que tive antes. Com frequência, desde então, tive não apenas uma convicção, mas uma deliciosa convicção. A doutrina me parece sempre extremamente agradável, brilhante e doce. A soberania absoluta é o que amo atribuir a Deus. Mas minha primeira convicção não era essa.
A primeira ocasião que me lembro desse tipo de deleite doce e interior em Deus e nas coisas divinas, no qual tenho vivido bastante desde então, foi ao ler estas palavras: “1 Timóteo 1:17  Assim, ao Rei eterno, imortal, invisível, Deus único, honra e glória pelos séculos dos séculos. Amém!
Enquanto as lia, veio à minha alma, e era como se, por assim dizer, fosse disseminado através dela, um senso da glória do Ser Divino; um novo senso, bem diferente de qualquer outro que experimentara antes. Nunca quaisquer palavras da Escritura pareceram para mim como aquelas. Pensei comigo mesmo que Ser excelente era aquele, e como eu seria feliz se pudesse desfrutar desse Deus, e ser arrebatado por ele para o céu; e ser, por assim dizer, tragado para sempre! Continuava falando, e, por assim dizer, cantando, estas palavras da Escritura a mim mesmo. E fui orar a Deus para que pudesse desfrutá-lo; e orei de um modo bastante diferente do que costumava fazer, com uma nova espécie de afeição. Mas nunca me veio ao pensamento que houvesse algo de especial, ou de natureza salvífica nisto.
Mais ou menos a partir desse tempo comecei a ter um novo tipo de apreensão e ideias de Cristo, e da obra da redenção, e do glorioso caminho da salvação por ele. Um doce senso interior das coisas, às vezes, vinha ao meu coração; e minha alma foi conduzida a agradáveis visões e contemplações dessas coisas. E minha mente estava grandemente ocupada em gastar meu tempo na leitura e meditação sobre Cristo, sobre a beleza e excelência de sua pessoa, e o amável caminho da salvação pela livre graça nele. Não achei nenhum livro tão deleitoso para mim, quanto os que tratavam desses assuntos. Aquelas palavras de Cânticos 2:1, costumavam estar abundantemente comigo: Eu sou a rosa de Sarom, o lírio dos vales. As palavras pareciam para mim docemente representar a amabilidade e beleza de Jesus Cristo. Todo o livro de Cânticos costumava ser agradável para mim, e eu sempre estava ocupado na leitura dele, naquela época. E achava, de tempos em tempos, uma doçura interior, que me conduzia em minhas contemplações. Isto não sei expressar de outro modo, senão por uma calma, doce abstração da alma de todas as preocupações deste mundo; e, às vezes, um tipo de visão, ou ideias e imaginações fixas de estar sozinho nas montanhas, ou em algum ermo solitário, longe de toda humanidade, docemente conversando com Cristo, e envolvido e absorvido em Deus. O senso que tive das coisas divinas, com frequência, inflamava repentinamente, por assim dizer, uma doce chama em meu coração, um ardor de alma, que não sei como expressar.
Não muito tempo depois que comecei a experimentar essas coisas, fiz um relato a meu pai de algumas delas, que tinham se passado em minha mente. Fui bastante afetado pela conversa que tivemos, e quando ela terminou, fui para longe, sozinho, a um lugar solitário no pasto de meu pai, para contemplação. E, enquanto andava por lá, e olhava para o céu e as nuvens, veio à minha mente um senso tão doce da gloriosa majestade e graça de Deus, que não sei como expressar. Parecia ver a ambas em uma união doce; majestade e mansidão juntas: era uma majestade doce, gentil e santa. E também uma mansidão majestosa, uma doçura terrível, uma gentileza alta, grandiosa e santa.
Depois disso, meu senso das coisas divinas gradualmente aumentou, e se tornou mais e mais vívido, e tive mais dessa doçura interior. A aparência de todas as coisas foi alterada; parecia haver, por assim dizer, uma calma, doce amostra ou exibição da glória divina, em quase todas as coisas. A excelência de Deus, sua sabedoria, sua pureza e amor pareciam se mostrar em todas as coisas: no sol, lua e estrelas; nas nuvens e no céu azul; na grama, flores, árvores; na água e toda a natureza, que costumavam prender grandemente minha mente.
Com frequência, costumava sentar e olhar a lua por um longo tempo; e, durante o dia, gastava muito tempo vendo as nuvens e o céu, para contemplar a doce glória de Deus nestas coisas. Enquanto isso, cantava, com uma voz baixa, minhas contemplações do Criador e Redentor. E havia poucas coisas, entre todas as obras da natureza, que fossem tão doces quanto o trovão e o relâmpago, que anteriormente haviam sido tão terríveis para mim. Antes, geralmente era aterrorizado de modo incomum com o trovão, e costumava ser tomado pelo terror quando via uma tempestade com trovões surgindo. Mas agora, ao contrário, isso me regozijava. Eu sentia Deus, se posso assim dizer, no primeiro surgimento de uma tempestade; e costumava aproveitar a oportunidade, em tais tempos, para me preparar a fim de ver as nuvens, e os relâmpagos brincarem, e ouvir a voz majestosa e terrível dos trovões de Deus, que, muitas vezes, era extremamente agradável, me levando à doces contemplações de meu grande e glorioso Deus. Enquanto estava assim ocupado, sempre me parecia natural cantar ou recitar minhas meditações; ou falar meu pensamento por meio de solilóquios em uma voz cantante.
Sentia, então, grande satisfação quanto ao meu bom estado; mas aquilo não me contentava. Tinha veementes desejos de alma por Deus e por Cristo, e por mais santidade, com a qual meu coração desejava estar cheio, e pronto a explodir. Isto sempre trazia à minha mente as palavras do salmista: Sl 119:20: “Consumida está a minha alma por desejar.” Sempre sentia uma tristeza e lamentava no coração que não tivesse me tornado para Deus mais cedo, para que tivesse tido mais tempo de crescer em graça. Minha mente estava enormemente fixada nas coisas divinas; quase que perpetuamente na contemplação delas. Passava a maior parte do meu tempo pensando nelas, ano após ano. Frequentemente, andava sozinho pelas florestas, em lugares solitários, para meditação, solilóquios, oração e conversa com Deus; e era sempre meu costume, em tais tempos, cantar minhas contemplações. Estava constantemente em oração exclamatória, onde quer que estivesse. A oração parecia natural para mim, como o suspiro por onde as chamas internas do meu coração saíam.
As delícias que agora sentia nas coisas da religião eram de um tipo bastante diferente daquelas anteriormente mencionadas, que tive quando garoto, e o que tive então era tão sem noção quanto um cego de nascença tem das cores agradáveis e belas. Elas eram de uma natureza mais interior, pura, animadora da alma e refrescante. Aqueles deleites anteriores nunca alcançaram o coração; e nem surgiram de qualquer visão da excelência divina das coisas de Deus, ou de qualquer sabor de satisfação da alma pelo bem que concede a vida que havia nelas.
Meu senso das coisas divinas pareceram aumentar gradualmente, até que fui pregar em Nova York, o que se deu cerca de um ano e meio depois que este senso começou. Enquanto estava lá, senti este senso de modo muito claro, em grau muito maior do que tinha sentido antes. Meus desejos por Deus e pela santidade cresceram bastante. Puro e humilde, santo e celestial, o cristianismo parecia extremamente amável para mim. Sentia um desejo ardente de ser, em tudo, um cristão completo; e de ser conformado à bendita imagem de Cristo; e que pudesse viver, em todas as coisas, de acordo com as normas puras, doces e benditas do evangelho. Tinha uma sede ávida por progresso nestas coisas. Isto me levava a perseguir e a me esforçar por elas. Era minha luta contínua, noite e dia, e minha investigação constante, saber como eu poderia ser mais santo, e viver mais santamente. E como poderia me tornar ainda mais filho de Deus, e discípulo de Cristo. Eu agora buscava um aumento da graça e da santidade, e uma vida santa, com muito mais avidez do que havia buscado a graça antes de alcançá-la. Costumava estar continuamente a me examinar, e a estudar e planejar os caminhos e meios prováveis para que vivesse uma vida santa, com maior diligência e veemência do que qualquer coisa que já buscara em minha vida. Contudo, ainda tinha muita dependência de minha própria força, o que, posteriormente, provou ser de grande dano para mim. Minha experiência ainda não me mostrara, como tem feito desde então, minha extrema fraqueza e impotência, de todos os modos; e as profundezas sem fim da corrupção secreta e do engano que havia em meu coração. Contudo, persisti com minha ávida procura por mais santidade e conformidade com Cristo.
O céu que eu desejava era um céu de santidade; estar com Deus e gastar minha eternidade no amor divino, e na santa comunhão com Cristo. Minha mente estava bastante absorta com as contemplações do céu, e com as delícias de lá, com o viver em perfeita santidade, humildade e amor. E, na época, costumava parecer uma grande parte da felicidade do céu que lá os santos pudessem expressar seu amor por Cristo. A mim me parecia grande obstáculo e peso que o que eu sentia por dentro não pudesse expressar como desejava. O ardor interior de minha alma parecia estar travado e trancado, e não podia livremente se inflamar como deveria. Pensava sempre em como, no céu, esta fonte poderia livre e plenamente fluir e se expressar. O céu parecia extremamente deleitoso, como um mundo de amor; e onde toda a felicidade consistia em viver no puro, humilde, celestial e divino amor.
Lembro-me dos pensamentos que tinha então acerca da santidade. Às vezes, dizia a mim mesmo: ‘Certamente sei que amo a santidade, tal como o evangelho prescreve.’ Parecia-me que nela nada havia senão aquilo que era arrebatadoramente amável; a mais alta beleza e amabilidade – uma beleza divina; muito mais pura que qualquer coisa aqui da terra; e que tudo o mais era como lama e corrupção em comparação com ela.
A santidade, como então escrevi em algumas de minhas contemplações a seu respeito, parecia ser de uma natureza doce, agradável, charmosa, serena e calma. Ela trazia uma pureza, brilho, paz e arrebatamento inexprimível para a alma. Em outras palavras, era o que tornava a alma semelhante ao jardim de Deus, com todo tipo de flores agradáveis, desfrutando de uma doce calma, e dos raios suaves e vívidos do sol. A alma do verdadeiro cristão, como então escrevi nas minhas meditações, se mostrava como uma florzinha branca que vemos na primavera do ano: pequena e humilde sobre o solo, desabrochando para receber os agradáveis raios da glória do sol; regozijando-se, por assim dizer, em um calmo arrebatamento; exalando em volta uma doce fragrância; permanecendo pacífica e amorosamente em meio às outras flores, todas semelhantemente abrindo seus botões para beber da luz do sol. Não havia nenhuma parte da criatura que me fizesse ter um senso tão grande de sua amabilidade como a humildade, o quebrantamento do coração e a pobreza de espírito; e não havia nada pelo que ansiasse mais avidamente. Meu coração desejava ardentemente me rebaixar diante de Deus, no pó, para que pudesse ser nada e Deus ser tudo, para que eu fosse como uma criancinha.
Enquanto estava em Nova York, às vezes, era muito afetado com as reflexões sobre minha vida passada, considerando como demorei para que pudesse ser verdadeiramente religioso, e como tinha sido ímpio até então. E, uma vez que pensava, chorava abundantemente, e por um tempo considerável.
No dia 12 de janeiro de 1723, fiz uma solene dedicação de mim mesmo a Deus e a escrevi. Entregava-me, e a tudo que tinha, para Deus, para não pertencer no futuro, em nenhum aspecto, a mim mesmo; para agir como alguém que não tem direito a si mesmo, em nenhum aspecto. E fiz um voto solene de tomar a Deus como minha inteira porção e felicidade, a não buscar a nada mais como qualquer parte de minha felicidade, nem agir como se fosse; e a tomar sua lei como regra constante de minha obediência. Dispus-me a lutar com todas as minhas forças contra o mundo, a carne e o diabo, até o fim de minha vida. Mas tenho razão para me humilhar infinitamente quando considero o quanto falhei em responder a minhas obrigações.
Tive, à época, muitas conversas religiosas e doces com a família com quem vivia, com o Sr. John Smith e sua piedosa mãe. Meu coração estava ligado em afeição àqueles em que havia sinais da verdadeira piedade. Não podia suportar nem mesmo pensar em outras companhias que não fossem a dos santos e discípulos do bendito Jesus. Tinha grandes desejos pelo avanço do reino de Cristo no mundo, e minhas orações secretas costumavam, em grande parte, ser ocupadas com isso. Se ouvisse a menor sugestão de qualquer coisa que acontecera em alguma parte do mundo, que me parecia, por algum aspecto ou outro, ser favorável aos interesses do reino de Cristo, minha alma prontamente se agradava, e isto muito me animava e refrescava. Costumava estar pronto a ler os jornais públicos, principalmente com este propósito, para ver se conseguia achar alguma notícia favorável aos interesses da religião [cristã] no mundo.
Retirava-me com frequência para um lugar solitário, às margens do rio Hudson, a alguma distância da cidade, para a contemplação das coisas divinas e conversação secreta com Deus; e tinha muitas horas doces por lá. Às vezes, o Sr. Smith e eu andávamos por lá juntos, para conversar sobre as coisas de Deus; e nossa conversa costumava girar em torno do avanço do reino de Cristo no mundo, e das gloriosas coisas que Deus realizaria por sua igreja nos últimos dias.
Tinha então, e em outros tempos, o maior deleite nas Sagradas Escrituras, acima de qualquer livro. Muitas vezes, ao lê-la, cada palavra parecia tocar meu coração. Sentia uma harmonia entre algo no meu coração e aquelas doces e poderosas palavras. Parecia sempre ver muita luz exibida em cada frase, e um alimento tão refrescante comunicado que não conseguia ir adiante na leitura. Com frequência, me detinha muito tempo em uma frase, para ver as maravilhas contidas ali; porém, quase todas as frases pareciam estar cheias de maravilhas.
Voltei de Nova York em abril de 1723, e tive uma despedida bastante dolorosa da Sra. Smith e seu filho. Meu coração parecia afundar dentro de mim, enquanto deixava a cidade e a família onde tinha desfrutado tantos dias doces e agradáveis. Vim de Nova York a Wethersfield de barco e, enquanto navegava, mantive a vista na cidade enquanto pude. Contudo, naquela noite, após esta dolorosa partida, fui grandemente confortado em Deus em West Chester, onde desembarcamos para nos alojarmos. Também tive um tempo agradável durante toda a viagem para Saybrook. Era doce para mim pensar em encontrar queridos cristãos no céu, onde não mais haveria despedida. Em Saybrook, desembarquei para me alojar no sábado, e lá guardei o Dia do Senhor, no qual tive um doce e refrescante tempo enquanto andava sozinho nos campos.
Depois que cheguei à minha casa, em Windsor, permaneci bastante tempo em disposição de mente semelhante a que tive em Nova York; apenas algumas vezes sentia meu coração pronto a afundar de saudades pelos meus amigos de lá. Meu auxílio estava nas contemplações do estado celestial, como descubro no meu diário de 1º de maio de 1723. Era um consolo pensar nesse estado, onde há plenitude de alegria; onde reina celestial, calmo e deleitoso amor, sem misturas; onde há continuamente as mais queridas expressões deste amor; onde há o desfrute das pessoas amadas, sem que jamais haja despedidas; onde aquelas pessoas que neste mundo parecem tão amáveis serão verdadeira e inexprimivelmente mais amáveis, e cheias de amor por nós. E quão secretamente os amantes mútuos se unirão para cantar os louvores de Deus e do Cordeiro! Como nos encherá de alegria pensar que este gozo, este doces exercícios, jamais cessarão, mas durarão por toda a eternidade!”
Assim profundas, decididas e poderosas eram as operações da divina graça sobre a mente deste eminente servo de Cristo. Que o seu entendimento era muito iluminado nas coisas de Deus, e seu coração profundamente afetado por elas, são circunstâncias que de imediato chamarão a atenção de todo observador sério. Havia nele uma santa ansiedade para obter o mais satisfatório testemunho de uma mudança de coração. Com este propósito, ele examinava íntima e diligentemente a si mesmo; não tinha inclinação alguma para evitar este autoexame. O exame pessoal parece ter sido considerado por ele ao mesmo tempo como algo agradável e um exercício importante. Muitos crentes professos se revoltam com o pensamento de tal pesquisa interior. Eles se contentam em olhar (e isso apressadamente) as coisas exteriores, mas não olham para dentro, ainda que esta negligência ponha em perigo seu bem eterno. Os sentimentos com os quais os homens encaram o dever do exame pessoal podem, com justiça, ser vistos como um critério preciso de seu estado espiritual, pois, em proporção à preocupação deles com a eternidade, estarão suas disposições em testar a si mesmos. Em outras palavras, na mesma medida em que a graça existe, haverá um desejo de investigar plenamente sua existência e progresso.
Após uma revisão da declaração dada pelo Sr. Edwards quanto às suas primeiras experiências religiosas, é evidente que ele não era dos que se satisfazem com quaisquer bases insuficientes: nenhuma indicação de descuido ou presunção pode ser discernida. Ele se olhava com um santo zelo; pensava, lia, conversava e, acima de tudo, orava, para que pudesse ser capacitado a mais acuradamente sondar o próprio coração, e assim escapar do perigo do autoengano, e ser convencido por provas que passaria pelo teste do julgamento de Deus; que era um filho da luz, objeto de santidade e herdeiro da glória. E assim, estudando a si mesmo sob a penetrante luz da Palavra, e das graciosas influências do Espírito de Deus, adquiriu este exato conhecimento dos variados exercícios e amostras exteriores do caráter cristão, o que o capacitou, em anos posteriores a, com tanta habilidade, separar aparências ilusórias daquilo que é sólido, e marcar a forte diferença entre o mero professo do nome de Cristo, e do verdadeiro participante do poder do evangelho. Foi nestes anos iniciais de sua vida que estas perspectivas corretas foram formadas, estas mesmas que, mais tarde, se expandiram em seu tratado admirável sobre as Afeições Religiosas.